30 de dezembro de 2009

Em 2010 a Primeira Coletânea de Artigos do Blog


Manual completo para profissionais e amantes da Equitação e Equoterapia . Em 2010 publicaremos nossa primeira coletânea de artigos do blog Equitação & Equitação Especial . São cento e onze artigos já publicados e ainda algumas matérias extras publicadas por nossos colaboradores . Os artigos abordam temas como a História da Equitação e do Método Equoterapia , Técnicas de manejo , treinamento e horsemanship voltadas a Equoterapia e a Equitação Especial . A coletânea de artigos não estará a venda . Para concorrer torne-se um seguidor do nosso blog e participe ! Confirme sua inscrição enviando email para equitacaoespecial@gmail.com

28 de dezembro de 2009

Transdisciplinaridade e Equoterapia : um novo paradigma

A história da produção do conhecimento chegou a nossos dias enfatizando a ciência como o modo hegemônico de produção. Outros tipos de conhecimento foram negados ou relegados a planos secundários. A ciência estabeleceu-se através da fragmentação do todo em partes de modo a permitir seu conhecimento. Isto levou ao surgimento de um grande número de disciplinas e especialidades. Baseada no conhecimento técnico, a ciência deu o passo gigantesco que produziu a revolução industrial e mudou a face de nosso planeta. No século 20, a aceleração da revolução técnica enrijeceu a estrutura da produção disciplinar do conhecimento científico e suscitou o questionamento dos axiomas dos paradigmas mecanicistas. A Teoria dos Quanta provocou uma nova revolução na física e na ciência. Novas necessidades tornaram imperioso o surgimento de equipes multi e interdisciplinares em todos os campos da ciência. Mais do que isso, o grau de complexidade dos fatos, desafios e problemas do mundo globalizado impôs a necessidade de resgatar a legitimidade do conhecimento aquém e além da ciência formal reconhecida. A transdisciplinaridade, como um paradigma emergente, propõe transcender o universo hermético da ciência e trazer para a superfície a multiplicidade fantástica dos modos de produção de conhecimento, assim como o reconhecimento da multiplicidade e diversidade de produtores de tal conhecimento. E assim nasce a necessidade de reforçar o valor de cada indivíduo-sujeito como produtor e portador de conhecimento legítimo. A transdisciplinaridade chama nossa atenção para a diversidade. Somos chamados à consciência da potencialidade das formas heterogêneas, em contraste com as tendências homogeneizantes de nossos tempos. Como afirmado por Morin (2002), para que a prática da transdisciplinaridade seja uma solução, uma “reforma do pensamento” faz-se necessária. Os princípios científicos estão em permanente processo de desenvolvimento, e sabemos hoje que eles não são um reflexo exclusivo da realidade objetiva. A estrutura do espírito humano e o conhecimento dos condicionantes socioculturais são também partes inseparáveis deles. O paradigma tradicional que ainda hoje prevalece está em meio a uma crise, e um novo paradigma surge como uma saída para a ultra especialização do conhecimento científico. De acordo com Santos (1996), as principais características do novo paradigmas são as seguintes: - a. o fim da dicotomia ciências naturais/ciências sociais, tanto quanto a superação de outras dicotomias, como natural/artificial, mente/matéria, observador/ observado, coletivo/individual; - b. a superação da fragmentação do conhecimento e do reducionismo arbitrário, com a busca do conhecimento do todo – conhecimento que não é nem determinista nem descritivo, estabelecido através de uma pluralidade de metodologias; - c. a necessidade de uma nova forma de conhecimento que inclua o sujeito; um conhecimento compreensivo e íntimo que pode ser transformado em sabedoria no viver quotidiano; uma forma de conhecimento que permita a contemplação do mundo, mais do que as tentativas de controlá-lo; - d. o resgate do bom senso, proporcionando o enriquecimento de suas dimensões utópicas e libertadoras através do diálogo com o conhecimento científico. A transdisciplinaridade foi pioneiramente mencionada por Piaget em 1970, quando ele propôs um nível superior de relações interdisciplinares. Ele considerava tais relações no bojo de um sistema total, sem fronteiras entre as disciplinas. Era como um sonho para Piaget. Foi a partir dos anos 80 que novos movimentos em diversos campos caracterizaram o novo paradigma. E essas correntes têm convergências claras em pensamentos que estão atualmente discussão: autopoiesis, auto-organização, pensamento complexo, inteligência coletiva, teoria das redes e muitos outros. Transdisciplinaridade e pensamento complexo contêm a diversidade e se constituem em poderosas ferramentas para se compreendê-la. E, para colocá-la em prática, é necessário, de acordo com Morin (2002), restabelecer as ligações entre os conhecimentos, implicando um novo processo de reaprendizagem da produção científica. A tendência no sentido da transdisciplinaridade não pode mais ser negada. O Primeiro Congresso Mundial de Transdisciplinaridade, no Convento da Arrábida, Portugal, de 2 a 6 de novembro de 1994, estabeleceu as bases definitivas. Assinada por Lima de Freitas, Edgar Morin e Basarab Nicolescu, a Carta da Transdisciplinaridade foi então adotada. Sua subscrição estava então, e ainda está, aberta a todos. É nossa vez de subscrevê-la. Ela precisa ser lida em sua totalidade, mas aqui transcrevemos seus quatro primeiros artigos: Artigo 1: Toda e qualquer tentativa de reduzir o ser humano a uma definição e de dissolvê-lo no meio de estruturas formais, sejam quais forem, é incompatível com a visão transdisciplinar. Artigo 2: O reconhecimento da existência de diferentes níveis de realidade, regidos por lógicas diferentes, é inerente à atitude transdisciplinar. Toda tentativa de reduzir a realidade a um só nível, regido por uma lógica única, não se situa no campo da transdisciplinaridade. Artigo 3: A transdisciplinaridade é complementar à abordagem disciplinar; ela faz emergir novos dados a partir da confrontação das disciplinas que os articulam entre si; nos oferece uma nova visão da natureza da realidade. A transdisciplinaridade não procura a mestria de várias disciplinas, mas a abertura de todas as disciplinas ao que as une e as ultrapassa. Artigo 4: A pedra angular da transdisciplinaridade reside na unificação semântica e operativa das acepções através e além das disciplinas. Ela pressupõe uma racionalidade aberta a um novo olhar sobre a relatividade das noções de “definição” e de “objetividade”. O formalismo excessivo, a rigidez das definições e a absolutização da objetividade, incluindo-se a exclusão do sujeito, conduzem ao empobrecimento. O que quero enfatizar ao escolher os quatro artigos iniciais para representar os fundamentos básicos da transdisciplinaridade? Mais uma vez aqui está a diversidade em minha mente.
Em primeiro lugar, a recusa a reduzir o ser humano a quaisquer que sejam as definições oferecidas pelas filosofias disponíveis. Em segundo lugar, a aceitação de diferentes níveis de realidade regidos por diferentes tipos de lógica. Em terceiro, a abordagem das disciplinas oferecida pela transdisciplinaridade, inclusive a nova visão da natureza e da realidade, tanto quanto a recusa da superioridade de uma determinada disciplina sobre qualquer outra. E a unificação prática e semântica de significados que transpassam e vão além de todas as disciplinas. Estamos ainda sujeitos a condicionamentos mecanicistas e reducionistas implícitos no paradigma Cartesiano/Newtoniano. O homem foi feito máquina. E assim, tornou-se objeto de técnicos. Além disso, os meios e as relações de produção capitalistas geraram um profundo processo de ruptura, de fragmentação, de egocentrismo, de desintegração da solidariedade. O homem é partido em múltiplas e conflitivas personae, a maioria delas determinadas pelas necessidades de produção e pelas demandas da sociedade capitalista. Bens de consumo baratos produzidos em larga escala são a fonte de poluição e degradação que estão ameaçando o meio ambiente em que vivemos. Fundamentalismos religiosos, sectarismos de diversos tipos, cegueiras e loucuras políticas, extremas avareza e cobiça sob o título de livre mercado são a fonte de miséria extrema, guerras e degradação humana. No campo da saúde humana, processos semelhantes acontecem. Pesquisas médicas são direcionadas às doenças geradoras de lucros e às suas drogas curativas. Parquíssimos recursos são destinados à prevenção, educação e saúde pública. O corpo humano é retalhado em partes e entregue aos cuidados de diferentes técnicos e técnicas. Sem alma, sem totalidade, sem ternura. Avareza e corrupção emergem. Ao final de tudo, pode-se concluir que as práticas políticas e as teorias econômicas ainda prevalentes abrem caminho para considerar todas essas perversidades como valores básicos, quando são de fato cruéis, fragmentadoras e polimórficas patologias humanas. Em julho de 1997, em uma entrevista para a revista Label France conduzida por Anne Rapin, quando perguntado sobre globalização e a “era planetária”, Edgar Morin respondeu que “…De fato, porque a globalização está fora de controle, ela é acompanhada por muitas instâncias de regressão. Mas, é uma possibilidade que poderia ser desejável. Obviamente, a globalização tem um aspecto muito destrutivo: ela gera anonimato, reduz as culturas individuais a um denominador comum e padroniza identidades. Contudo, ela é também uma oportunidade única para promover a comunicação e o entendimento entre as várias culturas dos povos do planeta e encorajar sua mistura (blending). Este novo capítulo acontecerá apenas quando nos tornemos inteiramente conscientes do fato de que somos cidadãos do planeta antes de tudo, e então europeus, franceses, africanos, americanos... o planeta é nosso lar, um fato que não nega os lares individuais de outros. A consciência de nosso destino global como uma comunidade é o pré-requisito para a mudança que nos permitiria agir como co-pilotos do planeta, cujos problemas se tornaram inseparavelmente inter-relacionados.
Caso contrário, iremos experimentar um destino semelhante àquele da “balcanização”, uma retaliação violenta e defensiva contra etnias específicas ou identidades religiosas, o que é o oposto deste processo de unificação e solidariedade através do planeta.” Agora, a globalização aqui está, a diversidade está aqui; o pensamento linear causa-efeito ainda regula nosso mundo moderno. Como podemos lidar com um tão vasto universo de disciplinas? Como a transdisciplinaridade pode nos ajudar? O campo atual da equoterapia em todo o mundo é ainda fortemente marcado pelo paradigma tradicional Cartesiano. A Babel de expressões que perpassa nosso campo de trabalho é um sintoma preocupante, mais do que uma salutar diversidade. Marguerite Malone (Serendipity Farm, Tuscaloosa/Alabama) chamou-me a atenção para um artigo de autoria de Ann C. Alden, ex-presidente da EFMHA, no qual se empenha em listar e definir os vários anacronismos usados no campo e que ela chama de “Sopa de Alfabeto”, que poderíamos chamar de “Sopa de Letrinhas”. Para ilustrar o sintoma acima descrito, apresentamos a seguir uma breve lista de denominações usadas para identificar o que fazemos. – Riding therapy (terapia através de equitação); – Therapeutic riding (equitação terapêutica); – Riding for the handicapped (equitação para deficientes); – Riding for the disabled (equitação para incapacitados);– Hippotherapy, hippotherapie (hipoterapia); – Equinoterapia; – Equotherapy, equoterapia; – Equine Assisted Therapy (terapia com auxílio de eqüino); – Equine Facilitated Therapy (terapia facilitada pela utilização de eqüinos); – Horseback Assisted Therapy (terapia com apoio de montaria a cavalo); – Equestrian re-education (reeducação eqüestre); – Equestrian rehabilitation (reabilitação eqüestre). Sofremos todos, com certeza, as conseqüências de nossa “Sopa de Alfabeto”, em nossa querida Torre de Babel. Comunicações difíceis, algumas vezes impossível, para dizer o menos. Não apenas entre nós, mas também com nossos associados, patrocinadores, praticantes e suas famílias e com o público. Embora não seja o propósito deste trabalho justificar e explorar a necessidade de adoção de uma linguagem unificada, este autor sugere enfaticamente a expressão equoterapia, cunhada pela Ande Brasil – Associação Nacional de Equoterapia. Esta palavra simples e densa inclui os termos “Equus” e “therapeia”. A expressão equoterapia está ainda livre de conotações comprometedoras e pode bem representar a abordagem transdisciplinar para as atividades terapêuticas conduzidas com a ajuda de um eqüino e de uma equipe multiprofissional. É seguro que uma palavra universalmente aceita muito contribuiria para unificar o campo das terapias com auxílio do cavalo e o aproximaria muito do paradigma transdisciplinar. Mais sintomático do que a diversidade de denominações para nossa atividade profissional é o modo como categorizamos nossos procedimentos técnicos. Em geral, os procedimentos terapêuticos são classificados de acordo com “programas”, ou metodologias específicas, especializadas, baseadas em um dado modo de perceber a patologia do cliente e suas necessidades percebidas. Eles são muito bem fundamentados, mas são também absolutamente fragmentadores. Eles são diretamente derivados dos paradigmas fragmentários e são por eles condicionados. Programas fragmentários, não importa o quanto sejam bem fundamentados, partem de uma concepção de um sujeito fragmentado e levam a abordagens fragmentárias, a equipes fragmentadas. Não podemos desconsiderar os efeitos condicionadores de estigmas avaliativos apoiados em técnicas de diagnóstico fragmentárias, baseados em simples percepções pessoais ou preconceitos institucionalmente predefinidos: equitação para deficientes ou para incapacitados. A diversidade de campos possíveis de conhecimento capazes de contribuir para a amenização do sofrimento humano com a ajuda de eqüinos é imensa. Assim também o número de pessoas capazes de ajudar. Mas, elas estão longe de nós. Elas não atendem aos nossos “elevados” padrões e requerimentos. Elas não estão formalmente incluídas no mundo científico. Pretendemos utilizar metodologias “inclusivas”, mas excluímos mais do que incluímos. De certo modo, agrada-nos sermos “exclusivos”, “prime”. Não é mera coincidência que as estratégias de marketing explorem tanto tais expressões. E elas nos fisgam. É nosso desafio diário colocar em prática o novo paradigma em nossas atividades, em nossos procedimentos terapêuticos. Se a concepção programática é adotada, cai-se facilmente no velho paradigma. Mesmo quando se tem o discurso do novo paradigma, é extremamente difícil colocá-lo em ação. Nossas qualificações profissionais, nossa formação acadêmica, nossos treinamentos e experiências em campos específicos, nosso compromisso formal com limites legais e profissionais, tudo isso contribui para a adesão ao velho paradigma. E esses tópicos não são nada simples. Permitam-me ilustrar meu ponto de vista utilizando o Equovida, um centro de equoterapia no Rio de Janeiro, Brasil, no qual o autor exerce um papel de coordenação. Somos atualmente uma equipe de 14 profissionais: 3 psicólogos, 5 fisioterapeutas, 3 fonoaudiólogos, 1 arte-terapeuta, 2 profissionais de equitação, e dispomos de cinco cavalos. Esta equipe desenvolveu-se através de um processo de seleção natural, com muita discussão. Quem deve conduzir o cavalo? Quem conduz a sessão terapêutica? Consideremos um primeiro caso: uma menina com paralisia cerebral. Este é um caso para hipoterapia, certo? O equitador conduz o cavalo, o fisioterapeuta conduz a sessão, certo? O psicólogo conversa com a família, certo? Vejamos o segundo caso: um menino autista. Este é um caso para o psicólogo, que conduz a sessão, certo? O equitador conduz o cavalo, certo? Posso ousar dizer que a resposta pode ser não, que não está certo? A menina com a paralisia cerebral pode ter sérios problemas de comunicação, possivelmente devidos a uma certa ordem de deficiências. O menino autista pode também apresentar sérios problemas de comunicação, possivelmente devidos a outros tipos de mau funcionamento. Nós reconhecemos que também nós temos sérios problemas de comunicação. Discutimos os casos. Todos da equipe. Todos, mesmo: psicólogo, fisioterapeuta, fono, arte-terapeuta, equitador. E outros profissionais, caso os tivéssemos. Após a discussão, três ou quatro de nós vamos para a pista, todos ao mesmo tempo. Nossas sessões são sempre individuais, no que diz respeito ao praticante. Um praticante, três ou quatro terapeutas. Algumas vezes, duas sessões ocorrem ao mesmo tempo: dois praticantes, cada um com sua equipe. Os praticantes escolhem o seu parceiro principal e certamente nos ajudam a escolher o cavalo. O parceiro principal conduz a sessão. As intervenções fluem. Algumas vezes, o equitador faz a interlocução com o praticante, o fisioterapeuta conduz o cavalo, a fono faz o apoio lateral, a arte-terapeuta conversa com a família. Ao final do dia, mais discussões em equipe. A interpenetração é permanente, os quebra-cabeças são compostos de peças que mudam de forma e apresentam figuras diferentes. Nenhuma peça é rígida, fixa. Muitas vezes, o estresse emerge. O caminho mais curto não é necessariamente o melhor caminho. Mais discussão é necessária. Quando o sol começa a se pôr atrás das montanhas e a luz amarelo-alaranjado do entardecer se filtra através das folhas da grande mangueira, um halo mágico ilumina a pista. As selas, brinquedos, cabeçadas são recolhidos e guardados. Grupos se reúnem; vozes, emoções, piadas, abraços, despedidas. Outro longo e exaustivo dia acaba. Esta é a nossa equoterapia.
Amauri Solon Ribeiro - Resumo

21 de dezembro de 2009

O Efeito Positivo da Equoterapia em Cegos

Um dos conceitos que define esse recurso terapêutico se refere a ele como um conjunto de técnicas reeducativas que atuam para superar danos sensoriais, cognitivos e comportamentais e que desenvolvem atividades lúdico-esportivas utilizando o cavalo” (Cittério, 1999). A equoterapia é um recurso terapêutico que pode ser aplicado as áreas de Saúde (portadores de necessidades especiais físicas, sensoriais e/ou mentais); Educação (indivíduos com necessidades educativas especiais) e Social (indivíduos com distúrbios evolutivos e/ou comportamentais). Os efeitos terapêuticos que podem ser alcançados com a equoterapia são de quatro ordens (Garrigue, 1999): • melhoramento da relação: considerando os aspectos da comunicação, do autocontrole, da autoconfiança, da vigilância da relação, da atenção e do tempo de atenção; • melhoramento da psicomotricidade: nos aspectos do tônus, da mobilidade das articulações da coluna e da bacia, do equilíbrio e da postura do tronco ereto, da obtenção da lateralidade, da percepção do esquema corporal, da coordenação e dissociação de movimentos, da precisão de gestos e integração do gesto para compreensão de uma ordem recebida ou por imitação; • melhoramento de natureza técnica: facilitando as diversas aprendizagens referentes aos cuidados com os cavalos e o aprendizado das técnicas de equitação; • melhoramento da socialização: facilitando a integração de indivíduos com danos cognitivos ou corporais com os demais praticantes e com a equipe multidisciplinar. A equoterapia exige a participação do corpo inteiro do praticante, contribuindo assim para o seu desenvolvimento global. Quando o cavalo se desloca ao passo, ocorre o movimento tridimensional do seu dorso; portanto, há deslocamentos segundo os três eixos conhecidos (x, y, z), ou seja, para cima e para baixo, para frente e para trás, para um lado e para outro. Tal movimento é transmitido ao cavaleiro pelo contato de seu corpo com o do animal, gerando movimentos mais complexos de rotação e translação.Os deficientes visuais constituem-se como o grupo que apresenta, talvez, as maiores e mais antigas preocupações, tanto para as ciências como para a filosofia. Filósofos têm teorizado sobre o fato de os olhos possuírem uma relação mística com a alma. A história nos relata sanções relacionadas à perfuração dos olhos como punição por crimes sexuais e sociais. Outros textos mostram os cegos reverenciados como adivinhos ou considerados como transmissores verbais das tradições e dos valores culturais. Até os dias atuais as atitudes para com os indivíduos cegos são diferenciadas e se revestem de benevolência social ou veneração pelo trabalho que realizam. Superstições e atitudes carregadas emocionalmente com freqüência estão associadas à cegueira. O público em geral considera a cegueira como a perda física mais limitadora que existe (Amiralian, 1997). A característica específica da cegueira é a qualidade de apreensão do mundo externo. As pessoas cegas precisam utilizar-se de meios não usuais para estabelecerem relações com o mundo dos objetos, das pessoas e das coisas que as cercam: essa condição imposta pela ausência de visão se traduz em um peculiar processo perceptivo, que se reflete na estruturação cognitiva e na organização e constituição do sujeito psicológico (Amiralian, 1997). O que não se pode desconhecer é que o deficiente visual tem uma dialética diferente, por causa do conteúdo que não é visual e da sua organização cuja especificidade é a de referir-se ao tátil, auditivo, olfativo, cinestésico. Dispor de todos os órgãos dos sentidos é diferente de contar com a ausência de um deles: muda o modo próprio de estar no mundo e de se relacionar (Mansini, 1994). O desenvolvimento humano se dá por meio de vivências e experiências que, no caso da criança cega, são mais restritos e limitados, o que pode acarretar uma lentidão e até mesmo dificuldades em seu processo de maturação. As crianças cegas congênitas constroem a imagem do mundo pelo uso efetivo dos outros sentidos, daí a necessidade de estimulação dessas estruturas sensoriais para compensar a ausência da visão e diminuir a defasagem psicomotora.
Implicações da equoterapia para o cego
Estimulação sensorial :Segundo Figueira (1996), o profissional, que tem como objetivo promover o desenvolvimento da criança cega, deve conhecer bem suas capacidades e seus potenciais, para explorá-los no decorrer do processo terapêutico. A criança cega não é capaz de se orientar, nem realizar adaptações em seu sistema muscular de acordo com as variações de posição, distância, tamanho e forma. Pela ausência da visão, as combinações autocorretivas de reforço mútuo entre a visão e as respostas motoras ficam muito comprometidas.Devemos lembrar que não existe substituição de um sentido por outro. O conjunto sensorial funciona em sinergismo, em que nenhum dos sentidos realiza suas funções de forma isolada, eles se retroalimentam. Nesse sentido todo o processo terapêutico deve promover uma ampla estimulação dos outros sentidos em conjunto.Nesse caso a equoterapia cumpre o seu papel terapêutico/educativo e de estimulação global do praticante cego, pois como diz Botelho (1999, p. 149):... a cada passo do cavalo o centro de gravidade do praticante é defletido da linha média, estimulando as reações de equilíbrio, que proporcionam a restauração do centro de gravidade dentro da base de sustentação. O sistema vestibular é assim repetidamente solicitado, estimulando continuamente suas conexões com o cerebelo, tálamo, córtex cerebral, medula espinhal e nervos periféricos. Por meio de inúmeras repetições do movimento do andar do cavalo, o mecanismo dos reflexos posturais e a noção de posição dos vários segmentos corporais no espaço são reeducados durante 30 minutos da sessão de equoterapia.Levando-se em consideração o local onde são realizadas as sessões de equoterapia, que por suas características naturais apresenta diversos estímulos auditivos e olfativos, além dos de comunicação que são proporcionados pela equipe multidisciplinar que realiza a intervenção, podemos considerar como um recurso que pode oferecer ao cego uma estimulação global e motivadora. Como diz Heimers (1970, p. 35):Os estímulos que vem de fora constituem um fator importante na vida dos videntes, e os cegos os desconhecem, por isto, devemos manter sempre alertas esses estímulos, devemos despertar o interesse da criança cega para que ela não caia no marasmo. O movimento ao ar livre, na natureza, traz consigo um mundo de ensinamentos e experiências.Reeducação postural :A coordenação e o ritmo de uma criança cega ao andar podem ser mais desordenados do que os de uma criança com visão. Se a criança cega não for encorajada a conduzir seu corpo de maneira adequada, pode ser que mantenha uma grande distância entre as pernas ao ficar ereta e desenvolva uma má postura e uma forma de andar incorreta. Um problema comum é o da criança que deixa cair a cabeça sobre o peito. A criança cega deve ser instada a manter a cabeça erguida, perpendicular em relação ao chão (Oliveira, 1996).A equoterapia vai ajudar na correção da postura, pois como diz Herzog (1989, p. 17):
... manter o equilíbrio significa, a principio, reconhecer uma atitude corporal pelo senso postural, depois reajustar sua posição. O cavaleiro deve coordenar seus próprios movimentos e dissociar os gestos dos braços e pernas. Ele é, portanto, conduzido a uma melhor compreensão de seu esquema corporal. Ele adquire, desde um primeiro contato, o domínio corporal, aprendizagem que, num primeiro momento, vai ser favorecida pelo terapeuta. É um trabalho que demanda concentração.Sabemos que o aprendizado das técnicas eqüestres exige que o cavaleiro mantenha uma colocação correta na sela, ou seja, manter o tempo todo uma postura adequada, o tronco ereto e a cabeça perpendicular em relação ao solo, além de ter que dissociar os movimentos de braços e pernas, para que acompanhe os movimentos tridimensionais do dorso do cavalo e possa realizar o manejo correto das rédeas.Durante as sessões de equoterapia, essas ações são desenvolvidas e estimuladas pelos terapeutas, fazendo com que o praticante realize o aprendizado correto da postura a cavalo. E como essas estimulações ocorrem por um período de 30 minutos, o número de informações proprioceptivas que provêm das regiões articulares, musculares, periarticulares e tendinosas são bastante diferentes das fornecidas quando estamos na posição de pé. As informações proprioceptivas dadas pelo passo do cavalo permitem a criação de esquemas motores novos: trata-se da reeducação neuromuscular.Relação com o outroPaschoal (citado por Araujo, 1997), ao falar de educação psicomotora para crianças cegas, diz que é necessário permitir que a criança cega, desde pequena, se utilize do contato físico na relação corpo a corpo. Num trabalho psicomotor é necessário que o adulto permita essa entrega de si, para que ela possa sentir que o outro se movimenta, gesticula e que ela também pode se movimentar, gesticular, se soltar, etc. O autor diz que há nesse ato uma tomada de consciência por parte da criança do potencial motriz do seu corpo, de uma forma muito natural, livre, na brincadeira, no jogo, no momento em que ela está mais aberta, pois está mais absorta.A equoterapia, como uma atividade que envolve a psicomotricidade, pode proporcionar à criança cega esse contato físico e de uma forma muito mais ampla, pois, desde o momento que o praticante cego chega ao local das sessões, ele é recebido pelos terapeutas e auxiliares e, enquanto aguarda sua vez, participa de jogos e brincadeiras, que permitem essa relação corpo a corpo. Quando está montado, esse contato físico passa a ser com o cavalo, que ele explora por meio dos outros sentidos, enquanto realiza os exercícios programados e o cavalo está ao passo.Os diversos movimentos que ocorrem numa sessão de equoterapia além de contribuírem para essa tomada de consciência de seu potencial motriz , ocorrem, geralmente, de uma forma bastante prazerosa . Estimulação para o desenvolvimento tátil Grifin e Gerber (1996, p. 15), em seu artigo Desenvolvimento tátil e suas Implicações na Educação de Crianças Cegas, ao se referirem ao desenvolvimento tátil de crianças cegas dizem que: ... a modalidade tátil é de ampla confiabilidade. Vai além do mero sentido do tato: inclui também a percepção e a interpretação por meio da exploração sensorial. Esta modalidade fornece informações a respeito do ambiente, menos refinadas que as fornecidas pela visão. As informações obtidas por meio do tato têm de ser adquiridas sistematicamente, e reguladas de acordo com o desenvolvimento, para que os estímulos ambientais sejam significativos. [...] A ausência da modalidade visual exige experiências alternativas de desenvolvimento, a fim de cultivar a inteligência e promover capacidades sócio-adaptativas. O ponto central desses esforços é a exploração do pleno desenvolvimento tátil.O programa por nós desenvolvido e aplicado no atendimento equoterápico de crianças cegas privilegiou a estimulação tátil, pois desde o primeiro momento em que chegam ao local de realização das sessões, as crianças são estimuladas a efetuar o reconhecimento da área, o que chamamos de ambientação, e é por meio da experiência tátil e dos outros sentidos que a realizam. Em seu primeiro contato com o animal, a criança, por meio da modalidade tátil poderá perceber sua forma, a textura do seu pelo, o calor de seu corpo, seus movimentos respiratórios, as diferenças dos pelos da crina e da cola, e aos poucos o reconhecimento dos equipamentos de montaria que serão utilizados durante as sessões. Esse procedimento é repetido em todas as sessões, para que a criança cega adquira o reconhecimento da estrutura e da relação das partes com o todo e também a consciência de qualidade tátil, importante para o seu desenvolvimento.Reforço e motivaçãoA esse respeito Figueira (1996, p. 8), diz o seguinte: ... em cada etapa do desenvolvimento uma capacidade emerge e é trabalhada pelo organismo, passando a ser integrada em uma escala crescente de desenvolvimento. Para que isto ocorra a criança necessita ser encorajada e reforçada pelos pais. Se não há reforço e motivação esta criança será invadida por uma sensação de insegurança e medo. O desenvolvimento psicomotor se realiza pela combinação do prazer que a criança sente ao ter experimentado algo novo (uma aquisição motora e/ou sensorial) e o reforço familiar à aquisição feita. Na equoterapia, os praticantes são encorajados e reforçados pelos membros da equipe que estão realizando a intervenção e, a todo momento, a cada ação realizada, a cada insegurança vencida, são estimulados a continuarem. Todo esse trabalho é realizado de forma a tornar o tempo em que permanecem montados o mais agradável e prazeroso possível, além de aproveitar todos os momentos e situações para o desenvolvimento dos outros sentidos.Aquisição ou reaquisição de esquemas motores e/ou mentais .As crianças cegas devem ter a oportunidade de vivenciar experiências totais de forma inteligente, ampla e generalizada que não somente compreendam conhecimento verbal e tátil dos objetos, mas também sua posição no espaço e no tempo, suas relações com a criança e com outros seres e objetos. Dessa forma ela vai se organizando, conhecendo e sentindo-se segura e confiante para se lançar em novas experiências (Figueira, 1996). Nesse contexto o cavalo é um instrumento cinesioterapêutico, um ser vivente, dócil, que responde aos afetos que recebe, que tem vontade própria e que precisa ser dominado, para que o cavaleiro realize o manejo que desejar. Para Cittério (1999, p. 35): “A equoterapia poderá ser colocada num importante processo de aquisição ou reaquisição de esquemas motores e/ou mentais, no qual o indivíduo se tornará protagonista do momento reabilitador, um indivíduo ativo porque motivado pela relação com um outro ser vivente.” Herzog (1989) relata que o cavalo pode ser um instrumento de acesso entre a realidade do praticante e a do terapeuta, funcionando ainda como intermediário entre o mundo intrapsíquico do praticante e o mundo exterior. Assim, o cavalo proporciona ao praticante a criação de uma nova imagem corporal, devido às informações recebidas da montaria e à relação com a equipe, o que favorece a estruturação do eu. O deslocamento a cavalo, tendo pontos de referência (no nosso caso estímulos sonoros), exige a representação mental do gesto e do deslocamento. O praticante deve respeitar o animal, fazendo com que ele compreenda aquilo que ele, praticante, decidiu sozinho. Isso faz com que o praticante que não fazia isso na vida cotidiana, o faça com o cavalo, resultando em uma revolução própria.Estimulação motora
Figueira (1996), quando reporta à assistência fisioterápica à criança cega congênita, reafirma que a melhor ajuda que a fisioterapia pode prestar é por meio da estimulação motora. A criança deve aprender a se movimentar, a conhecer seu corpo e ter prazer em se deslocar para descobrir o mundo que a cerca e dominar o espaço. A passividade impressa pela ausência da visão pode implicar alterações nas seguintes áreas: tônus muscular, postura, coordenação motora e psíquica, equilíbrio, orientação espacial, cinestésica e social. O recurso mais apropriado é a cinesioterapia por meio de exercícios passivos, ativo-assistidos e ativo-livres, de acordo com o propósito em questão. A cinesioterapia, ou seja, terapêutica pelo movimento pode ser realizada pela estimulação auditiva, olfativa, gustativa, tátil, proprioceptiva e cinestésica, visando a desenvolver a consciência corporal, a coordenação motora, o equilíbrio, a correção postural, a marcha e a orientação no espaço. A respeito dos ganhos em nível neuromotor, da equoterapia, Cittério (1992) relata que estes se evidenciam sobre o alinhamento corporal (cabeça, tronco, quadril), controle das simetrias globais, equilíbrio estático e dinâmico e que em nível psicológico percebe-se a melhora na capacidade de orientação e de organização espacial e também na capacidade executiva. Na equoterapia o cavalo atua como agente cinesioterapêutico, facilitador do processo ensino–aprendizagem e como agente de inserção e reinserção social. Cittério (1999) aborda o assunto, afirmando que não devemos nos esquecer da hipótese comportamentalista na qual se baseia a equoterapia, método considerado como condicionamento motor impresso no ritmo e no comando, também chamado de “pedagogia em movimento” ou ainda “ciência do movimento”, e outros autores o tratam como “sistema de vida”.
Carlos Henrique Silva: Mestre em Psicologia, Professor de Psicologia Experimental e Psicofísica, Membro da equipe do Programa de Equoterapia e do Núcleo de Estudos e Pesquisa Interdisciplinar em Trânsito e Transporte (NEPITT) da Universidade Católica Dom Bosco.
Sonia Grubits: PhD em Semiótica pela Paris 8 (Sourbonne), Doutora em Saúde Mental pela Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, Mestre em Psicologia Social pela PUC-SP, Coordenadora do Programa de Mestrado em Psicologia da UCDB.

16 de dezembro de 2009

A Organização da Equitação em Reflexos Condicionados

Em sua vida natural, o cavalo usa o cérebro para acionar a sua cadeia de reflexos, mas não para sustentar a ação dos andamentos, depois que começa a se movimentar. Na vida equitada do cavalo é o cavaleiro quem aciona a cadeia de reflexos do animal e determina a direção que o conjunto deve tomar, a velocidade e as ações que irão executar. Entender como funciona esse sistema é um grande passo para se aprender a usá-lo e ganhar uma equitação de alta performance.
Quando o cavalo é bem adestrado, o cavaleiro assume o comando das decisões para as mudanças de velocidade e direção com muita facilidade. Ou melhor: a decisão do cavaleiro substitui a decisão do cavalo para acionar o seu sistema reflexo que dará início à cadeia de movimentos. O corpo e as pernas do animal começam a se movimentar automaticamente, mais ou menos como um avião voando ‘no piloto automático’. A questão que deve ser lembrada neste momento é que o cérebro do cavaleiro, aciona a seqüência de movimentos do cavalo e estes são mantidos automaticamente em funcionamento pelas células do sistema nervoso situadas nas dilatações cervical e lombar do animal. Mas o cavalo é perfeitamente capaz de, durante a equitação, tentar tomar decisões por conta própria. Por exemplo, querer disparar de volta para as baias se não estiver gostando do passeio, aproximar-se de outro animal, ou simplesmente empacar diante de alguma coisa que o amedronta. Neste instante, haverá uma disputa entre o cavalo e o cavaleiro pelas tomadas de decisões. Neste momento, também, o cavaleiro inexperiente geralmente tenta retomar o comando à força usando esporas e chicote, que despertam o cérebro e a consciência do animal, e em conseqüência disso a sua rebeldia – e a confusão estará armada, como já vimos centenas de vezes por aí. Numa situação semelhante, o cavaleiro experiente, ao contrário, retomará sutilmente o comando da situação sem se fazer muito notado pelo cavalo – no máximo o animal perceberá a sua presença quando ele transmite, com atitudes e gestos tranqüilos a necessidade de avançar — o bom cavaleiro tem todos os atributos naturais de um líder. O conhecimento da cadeia de reflexos da equitação é de grande importância para o cavaleiro moderno que pode, finalmente, contar com um paradigma científico para a orientação de como organizar os seus comandos de maneira mais técnica e eficiente. O adestramento e o treinamento modernos são simplesmentea organização de toda a ação eqüestre em reflexos que foram condicionados e automatizados pelo adestrador durante muitas horas de treino. Esta organização dos reflexos da equitação do cavalo começa com o adestramento primário, também conhecido como doma de chão, onde o animal aprende a andar, trotar ou marchar, galopar, e mudar de direção, com os comandos emitidos pelo adestrador. A ‘doma’ moderna (1) deve ser entendida como um vôo simulado na aviação onde o cavalo aprende todas as manobras, sem os perigo da ação real. O potro, durante o adestramento primário, vai aprender as ações da equitação (2) administradas de forma compreensiva e progressiva, até receber o cavaleiro no dorso, quando então começa o adestramento básico, também conhecido como doma de cima, que é uma continuação dos mesmos comandos ensinados durante o adestramento primário, agora acionados pelo adestrador montado no dorso do cavalo. Etapa por etapa, o animal, com sua memória biológica infinita, aprende a se movimentar com a destreza e o seu equilíbrio natural, em todos os momentos da equitação. O ‘dressage’, ou adestramento clássico, é a modalidade eqüestre que mais depende da organização dos reflexos naturais do cavalo em seqüências de reflexos automatizados. Todos os andamentos, as transições, as piruetas e os apoios laterais dependem de um longo treinamento do cavalo e do cavaleiro para atingirem a fluência e perfeição destes movimentos cooperados. No hipismo, a aproximação dos obstáculos e a organização corporal do cavalo e do cavaleiro para realizarem o salto com movimentos casados, também requerem uma seqüência de reflexos ensaiados e automatizados para garantir o rendimento máximo da ação. Poderíamos até dizer que, o salto ideal deveria ser ensaiado com a precisão de uma figura de ‘dressage’. Na equitação rural, as provas de baliza e três tambores também são figuras automatizadas. Mas na apartação, por exemplo, a maioria dos comandos não parte do cérebro do cavaleiro. Os comandos reflexos partem do sistema nervoso do boi e são imitados pelo cavalo, em centésimos de segundo. É um duelo pessoal entre o cavalo e o boi, onde a função do cavaleiro é mostrar qual o bovino da manada que precisa ser separado, e a partir daí procurar não atrapalhar o trabalho do animal. Organizar a ação eqüestre em reflexos automatizados, sem provocar dor no cavalo, (porque isto despertará a consciência e a rebeldia do animal), é o grande segredo da equitação de alta performance, que está formando os grandes conjuntos e campeões da atualidade. Com esta nova percepção da realidade eqüina deverão também cessar as velhas rivalidades entre os sistemas de adestramento das escolas de equitação romana, germânica e de trabalho (rural ou western), que se digladiam há séculos sobre as melhores técnicas de se adestrar cavalos. Agora sabe-se que o bom sistema é aquele que se utiliza dos movimentos eqüestres na seqüência biológica em que o próprio cavalo se movimenta. Agora, também, podemos compreender porque os grandes mestres da equitação acadêmica, os homens que fizeram a história da equitação ocidental – Xenofonte, Pluvinel, Newcastle, Nestier, Eisenberg, La Guérinière, Baucher, L’Hotte, Fillis, e tantos outros, recomendavam o adestramento e o treinamento paciente, sem provocar dor no cavalo, com aulas curtas e freqüentes para não estressar o animal. “Meu objetivo é trabalhar o cavalo com calma, por pouco tempo, mas sempre” escreve Antoine de Pluvinel e “O cavalo deve ser devolvido à sua baia com o mesmo bom humor com que saiu”, recomenda La Guérinière. E a neurologia moderna confirma estas declarações.
Organizar a equitação em ações automatizadas no cavalo e no cavaleiro, demanda tempo e paciência. Mas, esta informação científica é certamente o maior trunfo da equitação do século 21, que agora promete se tornar mais bonita, mais espetacular e mais satisfatória tanto para o cavalo quanto para o cavaleiro. Mas, tudo isso poderia ter acontecido há mais de 100 anos se dois importantes personagens da história tivessem se encontrado. Com a participação involuntária de Dr. James Rooney. Particularmente eu não chamo de ‘doma’ a iniciação do cavalo para a equitação. Prefiro a expressão ‘adestramento primário’, porque este estágio se refere exatamente à fase primária da educação onde o animal aprende a aprender – sobretudo como lidar com os seres humanos com quem eles, em breve, vão ter que fundir os seus recursos neurofisiológicos durante a equitação. (2) Todas as modalidades eqüestres—o polo, o salto, o dressage—envolvem apenas três ações do cavalo: mudanças de velocidade, mudanças de direção e sustentação dos andamentos. O salto é uma mudança de direção para cima.

As Contribuições da Equoterapia na Educação Inclusiva

A política da educação inclusiva abre uma nova perspectiva como forma de valorizar o indivíduo para torná-lo um ser integrado na sociedade. Partindo deste pressuposto, a família é premissa básica onde se constitui o primeiro grupo social, que na história da humanidade nos remete à condição do "Ser" na relação homem-mundo, que se faz a cada dia. Com isso, a proposta educacional deverá estruturar-se como forma de ação-reflexão-ação, para atender às necessidades de todos indistinta-mente. Nessa perspectiva, gerada pela proposta de educação inclusiva, o direito da pessoa deficiente, à educação, está implícito na Declaração Mundial de Educação pa-ra Todos, aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1990 e que, por sua vez, inspirou o Plano Decenal de Educação para Todos . A integração da criança especial no contexto escolar não é um processo rápido, mas um desafio para ser enfrentado por todos educadores, como uma forma de ofe-recer oportunidades às pessoas especiais para satisfazer os seus desejos e anseios, exercendo seus direitos na sociedade. As bases do movimento de inclusão estão con-tidas no texto da Declaração de Salamanca (1994) que propõe: ...cada criança tem o direito fundamental à educação e deve ter a o-portunidade de conseguir manter um nível aceitável de aprendiza-gem, cada criança tem características, interesses, capacidades e neces-sidades de aprendizagem que lhes são próprias, os sistemas de edu-cação devem ser planejados e os programas educativos implementa-dos tendo em vista a diversidade destas características e necessida-des, as crianças e jovens com necessidades educativas especiais de-vem ter acesso às escolas regulares, que a elas se devem adequar a-través duma pedagogia centrada na criança, capaz de ir ao encontro dessas necessidades, as escolas regulares, seguindo esta orientação inclusiva, constituem os meios capazes para combater as atitudes discriminatórias, criando comunidades abertas e solidárias, constru-indo uma sociedade inclusiva e atingindo a educação para todos, a-lém disso, proporcionam numa educação adequada à maioria das crianças... É sabido que a escola regular, dentro de uma visão inclusiva, ainda incipiente no país, proporciona a criança especial o meio de desenvolver-se na diversidade com as diferenças. Para isto, a capacitação de professores é imprescindível dentro desta proposta, para que o professor esteja atento às peculiaridades desse aluno, não subes-timando pelas suas condições físicas, mas aplicando uma metodologia que atenda as necessidades de todos sem implicar em "exclusão" na inclusão. Nesse processo de educação inclusiva que tanto se fala, gostaria de destacar que na formação desses pequenos cidadãos, se faz necessário uma visão do viver na diversidade e com o espírito solidário; despertando nos alunos "ditos normais" sua importância na vida do colega especial, sendo também, referencial para a aprendiza-gem por imitação, repetição e criatividade, fatores preponderante como forma moti-vacional na criança especial, para o seu desenvolvimento, buscando desempenhar-se no contexto sócio-educacional, conforme as ações que o meio lhe oferece, respeitan-do o seu limite e tempo de cada aluno. Quando abordo a questão do limite e tempo de cada aluno, estou consideran-do que o aluno especial é capaz desenvolver-se e superar seus limites. Mas, para isso, é importante entender que o processo educacional requer o comprometimento da família e da escola, cabendo ao professor o conhecimento desempenhar-se nesta mis-são tão importante para as conquistas das crianças especiais. Segundo (OLIVEIRA, 1997,p. 12) Muitas das dificuldades apresentadas pelos alunos podem ser facil-mente sanadas no âmbito da sala de aula, bastando para isto que o professor esteja mais atento e mais consciente de sua responsabilida-de como educador e despenda mais esforço e energia para ajudar a aumentar e melhorar o potencial motor, cognitivo e afetivo do aluno. A proposta da educação inclusiva é de suma importância, a qual deve rever conceitos na matriz curricular, com abrangência na especificidade de cada deficiência, dando aos professores, na sua formação condições para efetivamente abraçar a edu-cação inclusiva. Com isso, a abertura de espaços para o novo com vista as tecnologias assistivas, imprescindível na vida da criança especial, possibilita na relação profes-sor/aluno uma relação de fidelidade, tão necessária para o desenvolvimento global da criança. Desde os tempos mais remotos o cavalo faz parte da vida do homem; a sua u-tilização como recurso pedagógico, cinesioterapêutico, psicoterapêutico e inserção social não é uma descoberta recente. A equoterapia é um método complementar e interdisciplinar que utiliza o cavalo dentro de uma abordagem nas áreas de educa-ção, saúde e equitação, buscando o desenvolvimento biopsicossocial de pessoas por-tadoras de deficiência e/ou necessidades especiais. A utilização do cavalo está embasado no seu movimento cadenciado, ritma-do, oferecendo ao cavaleiro e amazona "especiais" estímulos sensoriais e psicomoto-res. Este indispensável recurso para a prática equoterápica, congrega profissionais das mais diversas áreas, possibilitando assim desenvolver um programa que atenda as necessidades da criança por um todo, considerando a motivação e criatividade, como grandes aliadas para esta proposta educacional. Aplicada nos países europeus há mais de 30 anos este método contribui no de-senvolvimento global da criança, facilitando dentre outros fatores, trabalhar a sua função manual. O crescimento desta atividade no país vem possibilitando as pessoas com necessidades especiais uma melhor qualidade de vida. Segundo Hubert Lallery (1996 p.98 ) "A equoterapia é um dos raros métodos, talvez o único, que permite vivenciar-se tantos acontecimentos ao mesmo tempo, simultaneamente, e no qual as informações e reações são também numerosas." As contribuições significativas na prática da equoterapia, favorecem para a superação da dicotomia educação x saúde e vem requerer um planejamento e im-plementação sistematizadas na proposta educacional; possibilitando na interação com o meio e a natureza, o desenvolvimento de atividade na educação física, contri-buindo, assim, para melhora na coordenação motora, alinhamento postural, raciocí-nio lógico-matemático, auto-estima, atenção, concentração, estimulação sensório-motora, noção espacial, esquema corporal; oportunizando a criação de estratégias para uma proposta pedagógica que considere o sujeito na sua complexidade. Para o entendimento desses ganhos na equoterapia, é importante considerar que para (OLIVEIRA, 1997,p.16) .O sistema nervoso coordena e controla todas as atividades do orga-nismo, desde as contrações musculares, o funcionamento de órgãos e até mesmo a velocidade se secreção das glândulas endócrinas. Integra sensações e idéias, opera os fenômenos de consciência, interpreta os estímulos advindos da superfície do corpo, das vísceras e de todas as funções orgânicas e é responsável pelas respostas adequadas a cada um destes estímulos. O estímulo proporcionado na prática equoterápica oferece à criança especial, inserida na rede regular de ensino, um trabalho interdisciplinar, nos aspectos da e-ducação, saúde e promoção social, com possibilidades de um novo olhar para o mundo que a rodeia, ultrapassando os portões escolares, pois, permite a criança o contato com a natureza, participando de trilhas sob o dorso de um cavalo, conquis-tando novas formas de aprendizagem, possibilitando fazer uma educação corporal para melhora nas funções motoras, sem negar a importância da educação ambiental, facilitando assim, o seu desempenho em sala de aula e propiciando torná-lo cada vez mais independente e sujeito integrado. Nesse processo de construção e mudanças de paradigmas, busca-se desenvol-vimento de atividades que atendam à expectativa educacional da criança e da famí-lia. Com isso, a atividade promove momentos de ludicidade durante a prática equo-terápica, possibilitando o seu aprendizado de forma prazerosa. A maturação está relacionada à interação da criança com o meio, assegurando, assim, que todas as cri-anças têm a capacidade de aprender e, se são motivadas e estimuladas aprendem muito mais. Segundo VYGOTSKY apud BRAGA, 1995, p.85) " todo o processo edu-cacional pode ser descrito como criação de novas formas de comportamento" e que "a educação de uma criança deficiente não difere, em princípio, da educação de uma criança normal". Partindo desse ponto de vista, considero que o currículo escolar deverá ser apropriado às necessidades do aluno, possibilitando assim, a construção de esquemas motores para trabalhar suas potencialidades e despertar suas habilidades para uma motricidade eficaz para a construção da escrita. Estes ganhos, proporcionados pelos movimentos rítmicos do passo do cavalo, implicarão no desempenho pedagógico da criança que apresenta dificuldade: características de déficit de atenção, concentração e comprometimento na coordenação motora, lateralidade, sendo uma atividade coad-juvante na vida escolar da criança especial. Para Brito (2000, p.37): Trabalhar com criança é sentir-se um pouco criança... é possuir a ca-pacidade de se doar...trabalhar com criança especial é despertar nelas o prazer de ser criança... é fazê-la descobrir sua própria existência...desfrutar as etapas de sua vida...é viver cada momento. O conhecimento prévio da criança é bastante significativo, e deve ser conside-rado pelo professor para o seu aprendizado, o qual está relacionado à família, escola e sociedade. Desta forma, abre possibilidades para que a criança aprenda a aprender. Diante disso, o professor deverá ficar atento nesse momento tão significativo da cri-ança. À medida que, a criança é estimulada, motivada, ela apresenta resposta para novas conquistas e aprendizados. A família é o primeiro grupo social com o qual a criança convive. Neste con-texto deve caminhar juntamente com a escola, para o desenvolvimento psicomotor, cognitivo, linguístico e social. Na tríade: família, escola e equoterapia integram-se a proposta pedagógica, a qual estabelece uma relação harmônica na área da educação. Neste feedback da família, permite o acompanhamento de forma sistematizada no processo de construção e formação para o aprendizado da criança de forma integrada com a escola. Para Brito (2000, p. 53): Geralmente quando nasce uma criança, há quem diz: é a cara do pai... outros acham que é a cara da mãe...Mas, quando nasce uma criança especial, poucos se arriscam a dizer com quem se parece, porém, sem dúvida é a cara da família e o corpo da sociedade. É imprescindível o envolvimento da família neste exercício, pois, o seu com-promisso de educadora está relacionada, diretamente com a realidade de seu fi-lho/aluno, possibilitando grandes ganhos psicomotores somados com o aprendizado escolar. Para isto, a escola precisa estar aberta para que o êxito com a educação inclu-siva, se torne efetivamente uma realidade, com a adequação curricular atrelada às instituições que prestam seus serviços nas mais diversas áreas, possibilitando, assim, que todos façam parte deste contexto para tornar um ser integrado na sociedade. O acompanhamento da criança especial na rede regular de ensino paralelo as suas atividades psicoterapêuticas, convencionais, destacando entre elas - a prática de equoterapia, vem proporcionando melhoras significativas nas funções motoras das crianças, o que confirma o crescimento da equoterapia no Brasil, através de Associações e Centros. A Associação Bahiana de Equoterapia, em parceria com as institui-ções: Exército Brasileiro (19º- Batalhão de Caçadores), Polícia Militar (Esquadrão de Polícia Montada) e Centros Hípicos (Escola Equitação Equoterapia Jaguar), amplia as atividades extra curriculares da criança, dentro de um trabalho conjunto de cunho social. Neste aspecto, o fortalecimento de políticas públicas está buscando cada vez mais dar um enfoque no contexto que envolva a família, o meio social, valores, onde todos fazem parte do processo educacional com vista a responsabilidade social. De acordo com (CARDOSO,1997.p.18) O modelo ecológico em educação especial teve início na Europa, no início da segunda metade deste século. O enfoque da educação se-guindo este modelo era na saúde em vez de na doença, no ensino em vez de no tratamento, e na aprendizagem em vez de tentativas de mu-dar a personalidade." (CARDOSO,1997.p.18 in Ministério da Justiça). Esta proposta inovadora, para a prática da equoterapia, possibilita a criança especial, fazer uso de um ambiente, articulada com a proposta pedagógica da escola, que perpassa pela transversalidade. As crianças inseridas no programa, com o acompanhamento interdisciplinar, vêm o cavalo atendendo as suas necessidades na espe-cificidade, ao tempo em que acompanham outras crianças que praticam o hipismo clássico, modalidade esportiva, onde todos passam a fazer parte de um ecossistema, reconhecendo assim, o indivíduo com cultura e valores próprios no contexto no qual está inserido. Portanto, de acordo com GOMES: Para uma criança aprender, seja o conteúdo dado na escola, seja uma regra do jogo, um relacionamento com os colegas, com a professora, com os pais, seja uma história, um desenho ou um filme na televisão, ela precisa do funcionamento de um conjunto de características que agem integralmente. Estas características são orgânicas, motoras, cognitivas, emocionais, sociais e metodológicas. (GOMES, 2004. p.87 ) É na diversidade que se constrói uma sociedade igualitária. A escola com uma proposta pedagógica vem atender as necessidades de todos, envolvendo a comuni-dade e as organizações que prestam assistência especializada. Para isto, é preciso levar em consideração as potencialidades destas crianças, que são identificadas na prática equoterápica, para proporcionar-lhes um ambiente promissor de novas construções e aprendizagens, motivando-as, dando-lhes um no-vo conhecimento de mundo, para a superação de seus limites. Com isso, a educação inclusiva coloca em alerta onde fiquemos atentos para acompanhar o processo de construção da criança especial, e não marginalizá-la. Face ao exposto o comprometi-mento físico da criança jamais pode ser associado a uma situação de impossibilidade de aprendizagem. A realização da atividade prática da equoterapia possibilita trabalhar a criança de forma individualizada e/ou em grupo com o suporte psicoeducacional e terapêu-tico, com isso, esta proposta visa um olhar mais crítico da realidade de cada aluno especial, dando ao professor no momento escolar, melhor direcionamento na práxis pedagógica. Esta dinâmica, exige um acompanhamento interdisciplinar prevendo as adaptações, estabelecendo assim, um programa para atender às necessidades especí-ficas de cada aluno. Com isso, considero que a proposta da educação inclusiva envolve diversos segmentos da sociedade com um compromisso único, traçando novos caminhos para a quebra de paradigmas, apresentando um novo modelo nas questões sócio-educacionais. Neste contexto, as crianças de hoje serão adultos amanhã com um novo signi-ficado do viver na diversidade, sob a influência do ambiente social e cultural, que contribui para a formação de traços psicológicos das crianças integradas na educação inclusiva para sua formação profissional. Em entrevista, Sassaki afirma: "a inclusão profissional está apenas começando, por iniciativa de algumas poucas empresas, geralmente multinacionais, ou seja, in-fluenciadas pela prática inclusivista já adotada por essas mesmas empresas em seus países de origem – os Estados Unidos, por exemplo." Para isso, se faz necessário pensar na criança de hoje com projeção no futuro, considerando que a base educacional é fundamental para o seu crescimento. Esses mecanismos para a inserção da criança especial na rede regular de ensino são com-pensatórios da educação inclusiva, que provém da participação da família e da co-munidade, contribuindo de forma solidária, para a funcionalidade da equoterapia, como uma proposta ecológica curricular comunitária-participativa. As comprovações da eficácia da equoterapia na práxis pedagógica, justificam–se que tê-la como coadjuvante no programa curricular, vai beneficiar substancial-mente a criança especial, na condição de mediadora e facilitadora no acompanha-mento pedagógico. Ao sentar-se no centro de gravidade do cavalo, a criança especial recebe uma gama de estímulos sensoriais e proprioceptivos possibilitando aquisições psicomoto-ras. O cavalo andando a passo proporciona uma mobilidade pélvica na criança, rea-lizado ajustes tônicos que favorecem diretamente para o desempenho de forma glo-bal o que contribui para suas funções bimanuais e o aprendizado pedagógico. Para Severo (2006,p. 143) [...] essas funções do sistema nervoso humano, psicológicas e sociais podem ser desenvolvidas em equoterapia – utilização do cavalo co-mo instrumento terapêutico – (horse tool). Com programas educacio-nais, de ensino e aprendizagem centrados na criança e integrados com os princípios e fundamentos da equitação básica, podem ser tra-tadas crianças com dificuldades de aprendizagem por uma equipe multiprofissional e interdisciplinar, na qual deverá estar incluída uma pedagoga ou uma psicopedagoga competente. O programa de-verá estar sempre em parceria com a família e com os outros profes-sores da escola em que a criança estiver estudando. As crianças com suas funções motoras deficitárias e movimentos involuntá-rios, o seu desempenho motor é afetado refletindo diretamente na escrita. Com isto, a prática da equoterapia, realizada de forma prazerosa seguindo um programa estabe-lecido pela equipe interdisciplinar, vai intermediar e contribuir nas atividades escolares. Cabe-nos uma reflexão: A equoterapia pode ajudar na ação pedagógica? Ao questionar Severo (2006, p. 143) afirma que: Para se entender os benefícios psicomotores da equoterapia no ser humano e principalmente, na criança, há necessidade de se estabele-cer, à priori, que o ser humano é um produto filogenético, ontogenético e cultural, sendo o sistema nervoso, os estados psicológicos e as situações sociais, os grandes responsáveis pelas aquisições da apren-dizagem e dos desempenhos comportamentais. Em segundo lugar, há necessidade de se entender que o desenvolvimento psicomotor an-tecede o desenvolvimento cognitivo e emotivo, segundo vários auto-res. Os fatores psicomotores distribuídos pelas unidades funcionais de Luria são apresentados como circuitos dinâmicos auto-regulados, construídos segundo o princípio da organização vertical das estrutu-ras do cérebro e dependentes de uma hierarquização funcional e afe-tiva, que ocorre em todo o desenvolvimento da criança. Todos os en-gramas psicomotores reunidos funcionalmente compreendem uma complexa constelação psicomotora, pois cada um contribui, particu-larmente, para a organização global do sistema funcional psicomo-tor... Educar é ajudar o ser humano com os princípios e os fundamen-tos do ensino e da aprendizagem, informal e formal, na família e na sociedade, a transformar-se pelo crescimento e pelo desenvolvimento biopsicossocial em um cidadão com liberdade, felicidade e paz. Nesta condição, as contribuições da equoterapia na educação inclusiva, pro-movem a motivação para os outros alunos, a experimentação em estar no dorso de um cavalo, onde o objeto de desejo com fins psicoterapêuticos para as crianças espe-ciais passa a despertar nas crianças "ditas normais", a utilização do mesmo com fins esportivos. Com este referencial, procuro estabelecer esta relação possibilitando a-través da experimentação, da integração e percepção como uma forma de conviver com as diferenças e entender as necessidades do outro, respeitando-os na relação homem-mundo que se encontra e se constrói nos aspectos de forma interpessoais e intrapessoais. É um momento significativo na vida da criança: de descoberta, aproximação das relações, afetividade, compreensão das limitações; é a descoberta das potencialidades, de acreditar nas suas capacidades de responder aos variados estímulos sensó-rios-motores provenientes que o meio oferece. Estes ambientes facilitadores implicam na interconexão e suas influências externas, nesta modalidade de aprendizagem, sendo transformada pelo ambiente que o transforma na participação ativa, interagin-do com pessoas, objetos materiais e animais. Nesta versatilidade do currículo, a atuação prática em equoterapia, busca a-tender as necessidades da criança especial, com atividade extra-curricular, que su-plementa na proposta pedagógica, capaz de proporcionar ao aluno um ambiente aco-lhedor e significativo para o seu desenvolvimento. Com isso, as experiências trazidas do seu meio familiar e a prática de equoterapia, contribui, assim, com a melhora na coordenação motora fina, equilíbrio postural, desempenho nas atividades escolares, melhora na escrita e maior socialização. Este trabalho relaciona-se com a minha prática em equoterapia, atuando há 16 anos, com conhecimentos adquiridos com participação de cursos promovidos pela Associação Nacional de Equoterapia, Brasília, leitura de artigos, livros, seminários, revistas, participação no Congresso Internacional de Equoterapia dentre outros re-cursos áudio-visuais e a minha formação acadêmica, tão importante para a compre-ensão da sistemática aplicada na proposta da educação inclusiva, considerando a e-quoterapia um recurso tecnológico para a prática educativa e desenvolvimento da psicomotricidade na criança especial e grande aliada para o seu desempenho global. O método foi introduzido no Brasil em 1989, através da Associação Nacional de Equoterapia com o propósito de incentivar também a implantação de associações estaduais; a sua nomenclatura é diversificada em diferentes países como: equoterapi-a, equinoterapia, equitação terapêutica, hipoterapia. "Equo" origina-se do latim "e-quus", é de suma importância enfatizar que o cavalo pertence à ordem dos perisso-dálitos, da família dos eqüídeos, da sub-família equínea na qual se encerra o único representante atual do gênero equus, que é a espécie "caballus" ou seja, o cavalo propriamente dito como é hoje em dia; Terapia vem do grego "therapeia", parte da medicina que trata da aplicação de conhecimentos técnico-científicos no campo da reabilitação e ou/reeducação. (CIRILLO, 1991, p. 1).

Maria Cristina Guimarães Brito

12 de dezembro de 2009

Dia Nacional da Equoterapia

9 de dezembro de 2009

Postura sobre o Cavalo e a Velocidade do Passo : a influencia na ativação dos músculos eretores lombares

O desenvolvimento motor normal é caracterizado pelas aquisições nos sentidos crânio-caudais e próximo-distais, ou seja, iniciando o ganho do controle postural pela musculatura cervical, seguida de tronco e pelve. O desenvolvimento próximo-distal se inicia pelas articulações mais próximas da linha média, para então as mais laterais. Segundo Kandel; Schwartz e Jessel (1997), os músculos axiais (tronco) e apendiculares (proximais) do homem são usados na manutenção do equilíbrio postural, enquanto os músculos distais são utilizados para atividades manipulatórias. A importância do controle postural e da manutenção do equilíbrio se dá pelo fato da necessidade destes para um bom desempenho nas atividades motoras finas, como preensão, alcance e escrita.Assim, segundo Medeiros e Dias (2002), o ato motor baseia-se em duas atividades: a desentir e perceber, e a de realizar movimentos. Estimulando os três sistemas sensoriais (sistema vestibular, sistema visual e sistema proprioceptivo), a equitação terapêutica facilitará o aprendizado motor, levando a mudanças na organização e número das conexões neurais, chamado de plasticidade neuronal.O sistema vestibular é estimulado a partir da movimentação da endolinfa. O aparelho vestibular é o órgão que detecta as sensações de equilíbrio, e é composto por um sistema de tubos e câmaras no labirinto ósseo. Dentro deste está o labirinto membranoso, que é composto pela cóclea, por três canais semicirculares e por duas grandes câmaras chamadas utrículo e sáculo, responsáveis pelo equilíbrio.Os três canais semicirculares são sensíveis às acelerações angulares (rotações). O utrículo e sáculo são sensíveis às acelerações lineares (translações e a gravidade). A combinação dos dois sistemas assegura a percepção de todas as acelerações possíveis. O processo de estimulação vestibular se inicia com o fundamento da semelhança da marcha humana com o andar do cavalo. É através do conhecido movimento tridimensional que o cavalo promove no corpo do indivíduo montado sobre seu dorso, que a musculatura do tronco é ativada, de maneira a impedir a queda pelas oscilações constantes. Quando sobre o cavalo, o indivíduo está exposto a estas oscilações de maneira bem peculiar. Partido do animal parado, e iniciando o seu deslocamento pela pata posterior direita, o membro seguinte a se deslocar será a pata anterior esquerda. Desta maneira, a pelve do cavaleiro recebe estes movimentos, desencadeando o processo de recrutamento muscular e ajuste tônico para evitar a queda. Movimentos verticais da garupa Baumann (1978) extraída de Uzun (2005) Movimentos átero-laterais da garupa Baumann (1978) extraída de Uzun (2005) Nos casos de lesões neurológicas, onde estas reações estarão comprometidas, o cavalo beneficia o aprendizado motor através da repetição dos movimentos oscilatórios da pelve e tronco. Sendo a hipoterapia uma técnica essencialmente direcionada à reabilitação, é voltada para pessoas portadoras de deficiência física e/ou mental.9 A escolha adequada do animal, ou seja, a freqüência do passo, é de suma importância para se obterem as respostas posturais adequadas para cada paciente. O animal que apresentar um número maior de passadas por minuto (antepistar) irá ativar os receptores proprioceptivos intrafusais, que só respondem a estímulos rápidos, como também os receptores articulares que respondem à pressão, gerando aumento do tônus, indicado para pacientes hipotônicos. Em contrapartida, quando o cavalo apresentar uma freqüência baixa de passos (transpistar), diminuirá a velocidade de inputs dos estímulos proprioceptivos, mantendo o movimento rítmico e cadenciado, estimulando assim o sistema vestibular de forma lenta, contribuindo para diminuição do tônus muscular de todo o corpo, sendo indicados principalmente para pacientes hipertônicos. Para melhor análise das atividades musculares realizadas durante estas terapias, observamos inicialmente indivíduos sem alterações neurológicas, analisando assim apenas variações de recrutamento muscular, sem possíveis interferências de espasmos musculares ou desvios posturais . Participaram deste estudo 9 sujeitos, com idades entre 20 a 25 anos, sexo feminino, sem alterações motoras. O critério de inclusão no estudo foi apresentar bom estado geral, sem dores ou alterações posturais. A montaria foi realizada em uma égua de 13 anos, sem raça definida. O espaço utilizado foi um picadeiro de 20 X 60 metros, solo de areia.Para análise quantitativa dos resultados, foram utilizados aparelho de eletromiografia de superfície da marca MIOTEC® e software Myography® com 4 canais. Para a montaria, foi utilizada manta de atendimento, tipo “galope”, sem alças ou estribos. A coleta era iniciada com a colocação de eletrodos circulares pré-geldados de cloreto de prata Medtrace®, espaçados 2.5cm entre eles, sendo posicionados no ponto motor dos músculos eretores lombares, de acordo com a técnica sugerida por Cram et al. (1998). Os sujeitos foram observados primeiramente no solo, para então montarem no cavalo. Todas as posturas foram coletadas no mesmo dia, sendo que a ordem da coleta foi, respectivamente: com o cavalo ao passo, no qual o sujeito se encontrava montado com o corpo direcionado para a frente, sempre tendo como referência a cabeça do cavalo, e de costas à cabeça do cavalo – dorsal. Com o cavalo ao passo rápido foram coletadas as mesmas posturas, num percurso linear de 20 metros. Durante este período os sujeitos se mantiveram por todo o tempo se sustentando sozinhos, sem auxílio de qualquer terapeuta, porém ao lado havia dois terapeutas, para a segurança do paciente, e um condutor para o cavalo. Freqüência do cavalo transpistar (Medeiros, Dias, 2002) Para coleta dos dados, foi utilizado notebook conectado ao aparelho eletromiográfico, sobre um suporte estável, porém móvel, que se manteve acompanhando lateralmente o cavalo durante as coletas. Para análise dos dados foi considerada a média do recrutamento muscular em cada tarefa.O estudo foi baseado na análise dos dados obtidos do resultado da eletromiografia. A análise estatística utilizada foi o Teste de Wilcoxon, que possui nível de significância de 0,05 (5%).Analisando os dados obtidos, comparamos as seguintes posturas, iniciando pelos resultados da comparação dos movimentos para a posição frontal: Concluímos que existe diferença média estatisticamente significativa entre as velocidades para a posição Frontal somente nos valores de média, onde inclusive, a média da velocidade rápida é de fato maior que a média da velocidade lenta. Para pico não foi encontrada diferença significante entre as velocidades. Continuaremos comparando as velocidades, mas agora para a posição de dorsal.
Média Pico
Dorsal Dorsal Dorsal Dorsal
Lento Rápido Lento Rápido
Média 56,89 77,22 103,11 142,44
Mediana 47,5 56 75 85,5
Desvio Padrão 44,92 61,31 89,81 120,77
Limite Inferior 36,14 48,90 61,62 86,65
Limite Superior 77,64 105,54 144,60 198,24
p-valor 0,001 0,004
Para a posição de dorsal, concluímos que existe diferença significante entre as velocidades, tanto para a média quanto para o pico. Averiguamos ainda que em ambas as situações a maior média se encontra sempre na velocidade rápida.

Média Pico
Frontal Frontal Frontal Frontal
Lento Rápido Lento Rápido
Média 30,00 38,00 57,11 67,44
Mediana 25,5 28,5 47 65,5
Desvio Padrão 21,40 24,70 39,20 31,12
Limite Inferior 20,11 26,59 39,00 53,07
Limite Superior 39,89 49,41 75,22 81,82
p-valor 0,009 0,107

Concluímos que existe diferença média estatisticamente significativa entre as velocidades para a posição Frontal somente nos valores de média, onde inclusive, a média da velocidade rápida é de fato maior que a média da velocidade lenta. Para pico não foi encontrada diferença significante entre as velocidades.Continuaremos comparando as velocidades, mas agora para a posição de dorsal.

Média Pico
Dorsal Dorsal Dorsal Dorsal
Lento Rápido Lento Rápido
Média 56,89 77,22 103,11 142,44
Mediana 47,5 56 75 85,5
Desvio Padrão 44,92 61,31 89,81 120,77
Limite Inferior 36,14 48,90 61,62 86,65
Limite Superior 77,64 105,54 144,60 198,24
p-valor 0,001 0,004

Para a posição de dorsal, concluímos que existe diferença significante entre as velocidades, tanto para a média quanto para o pico. Averiguamos ainda que em ambas as situações a maior média se encontra sempre na velocidade rápida.Continuando, vamos comparar a posição frontal versus dorsal para o passo rápido:
Média Pico
Frontal Frontal Frontal Frontal
Rápido Rápido Rápido Rápido
Média 38,00 77,22 67,44 142,44
Mediana 28,5 56 65,5 85,5
Desvio Padrão 24,70 61,31 31,12 120,77
Limite Inferior 26,59 48,90 53,07 86,65
Limite Superior 49,41 105,54 81,82 198,24
p-valor 0,002 0,006
Averiguamos que, também para o movimento rápido, existe diferença entre as posições que são consideradas estatisticamente significantes, tanto em média quanto em pico. Verificamos ainda que a média da posição dorsal é sempre a maior que a média da posição frontal.O presente estudo foi realizado apenas em indivíduos sem comprometimento motor, com o intuito de excluir possíveis interferências de tônus ou alterações de equilíbrio. A análise comparativa foi realizada através de testes estatísticos individuais, ou seja, a variação do recrutamento muscular foi vista de acordo com os dados do indivíduo com ele mesmo, para então serem pareados com os demais.Com isto, pudemos observar a interferência direta da velocidade da andadura do cavalo no grau de recrutamento muscular, como também a mudança de postura variandosignificativamente o recrutamento muscular. A variação do passo no cavalo, velocidade, estimulação da direção e equilíbrio têm comoresposta o deslocamento do centro de gravidade do paciente, facilitando na dinâmica daestabilização postural e restabelecimento da desordem motora.1,4,7,8 Portanto, é necessário que o paciente aumente o recrutamento muscular para manter-se sobre o cavalo, o que se pôde observar na diferença de ativação da musculatura analisada deste em quaisquer das posturas, em comparação tanto com o cavalo no passo lento, como deslocando-se em maior velocidade – sempre mantendo a andadura ao passo. O sistema nervoso central interpreta estes desequilíbrios como instabilidades posturais capazes de provocar queda, respondendo com aumento do tônus postural. Assim, os eretores da coluna são ativados como forma de manter suas reações de equilíbrio. Gusman e Torre (1998) definem que as reações de equilíbrio servem para ajustar a postura, manter e recuperar o equilíbrio antes, durante e depois do deslocamento do seu centro de gravidade. O estudo da atividade muscular durante os movimentos do passo do cavalo é de suma importância para o fisioterapeuta, podendo este, a partir destes dados, realizar as mudanças posturais de forma mais direcionada a cada paciente. Com os resultados obtidos, pudemos concluir que a postura dorsal solicitou sempre maior ativação muscular dos eretores lombares, conseqüentemente, é a postura que irá trabalhar com maior intensidade o controle do tronco. Na prática clínica nos deparamos com alguns pacientes que apresentam limitações articulares, decorrentes de espasticidade severa, encurtamentos musculares, e outras complicações. Estas limitações muitas vezes impedem as mudanças posturais que poderiam ser realizadas numa sessão de hipoterapia. Com isto, o trabalho baseado na velocidade do passo do cavalo tornase essencial para o direcionamento do ganho motor desejado a determinados pacientes. Vimos neste estudo que o recrutamento muscular variou significativamente nas mudanças da velocidade do passo do cavalo, o que na prática significa que, mesmo sem alterar a postura sentada no cavalo, podemos recrutar de diferentes formas e intensidades a musculatura do tronco, variando assim a intensidade do trabalho postural, sem precisar deslocar o paciente sobre o cavalo. Com isto, sugerem-se futuros estudos aplicados a patologias diversas, traçando assim a conduta terapêutica mais adequada para cada patologia tratada.
Autora: Rebeca de Barros Santos Co-autores: Fábio Navarro Cyrillo,Mayari Ticiani Sakakura,Adriana Pagni Perdigão,Camila Torriani

4 de dezembro de 2009

The Flying Change : A Mudança de Pé no Ar

Os cavalos que tem um bom galope, com ação e mobilidade, já demonstram quando jovens, a facilidade para a mudança de pé. Naturalmente eles aprenderão com mais rapidez este exercício, ao contrario de outros cavalos que tem pouca qualidade nesta andadura e poderão ter problemas e vícios ao executar esse movimento.A execução correta;A mudança de pé correta, executada no Adestramento Clássico, é feita no galope reunido. Ela tem estreita ligação com o tempo de suspensão que se segue a cada lance de galope, portanto quanto "menos tempo de suspensão" o cavalo apresentar no galope, com menos qualidade ele fará a mudança de pé. As mudanças de pé podem ser executadas isoladas ou em séries . quer dizer 4,3 e 2 tempos e ao tempo (a cada galão). Somente nas provas de "Adestramento de nível Médio" é que são solicitadas as "mudanças de pé" isoladas, e conforme as exigências vão evoluindo, como na série Forte onde as mudanças são pedidas a 4, 3, e 2 tempos. As "mudanças de pé" ao tempo ( a cada galão) fazem parte da série Especial. Nas mudanças isoladas ou nas séries, o cavalo deve se conservar "leve, calmo, reto e com impulsão constante". A "cadência e o equilíbrio" não se modificam ao longo de todo movimento. O grau de reunião nas "séries" poderá ser um pouco menor que o normalmente pedido, a fim de evitar um encurtamento dos lances e uma perda da leveza e fluência.As ajudas ; A ajuda, o comando para executar a mudança, é solicitada no momento em que os "três membros estão no chão" e o "anterior interno inicia o movimento da passada do galope" (no terceiro tempo). O cavalo muda neste momento a batida dos seus posteriores e anteriores. A mudança é calma mas ao mesmo tempo enérgica, ganhando amplitude e mantendo a retidão do cavalo. A garupa e as espáduas não se deslocam de um lado para outro. A mudança não é rasa, curta, sem energia, interrompendo assim a cadência e a fluência do galope. Quando o cavalo tensiona a garupa (garupa alta) e faz a mudança mais para cima do que para frente, é sinal de que falta mais descontração e impulsão. Um momento antes de pedir a mudança de pé, o cavaleiro executa uma meia-parada (chamada de atenção), dá uma ligeira indicação, uma leve encurvatura com a rédea interna para o lado em que vai mudar o galope, mantendo porém a retidão. Esta leve encurvatura não deve ser confundida com rédeas tensas ou curtas. Tomamos por exemplo a mudança de pé da "direta para a esquerda" O cavaleiro prepara a mudança ativando o pé interno do cavalo (o pé direito). No momento exato descrito acima, ele pede a "mudança de pé" para a esquerda com a sua perna direita que se desloca mais atrás da barrigueira ( a ação de perna e assento se dá ao mesmo tempo). A perna interna do cavaleiro, durante o momento da mudança, mantém um leve contato e sustentação para que o cavalo não desequilibre para a esquerda. A rédea externa ( agora a direita), mantém contato para que as espáduas não desequilibrem. No momento em que o cavalo executa a "mudança de pé", a mão interna, que deu uma leve indicação, fica mais suave para que ele possa fazer a mudança com as espáduas livres e descontraídas. As pernas e a bacia é que dão o comando para as mudanças. A bacia interna empurra e avança para a mão da mudança e as mãos leves deixam o cavalo executar o movimento com liberdade. A ação das pernas e assento se dão ao mesmo tempo, mas sem interferir no posicionamento correto da parte superior do corpo. Defeitos ; Se o cavalo muda os seus anteriores mas não os posteriores (galope cruzado), ou atrasa o posterior interno, é resultado da falta de impulsão e força dos posteriores, ou também de indefinição das ajudas. Os cavalos que jogam muito a garupa devem fazer as mudanças ao longo da parede do picadeiro, evitando assim que ele se entorte. Do galope falso para o galope justo). Se o cavalo tende à aumentar demais o galope antes da mudança, a transição galope, passo, galope, ajuda na correção para que ele continue no galope calmo e ritmado. "Tensão, ansiedade, ajudas bruscas e medo devem ser evitados". Muitas vezes o próprio cavaleiro tende à ficar tenso na sua musculatura, dando ajudas muito fortes e indefinidas - é de vital importância a posição correta e definição clara. Se o cavaleiro se desloca da sela jogando o seu peso sobre os anteriores do cavalo, ou se não está bem centrado, irá atrapalhá-lo muito neste exercício. As mãos não podem ser brutas (pois é onde o cavalo apoia a sua boca), nem altas demais ou afastadas demais. O cavaleiro que não tiver experiência, uma posição correta e não souber em que momento o cavalo está usando os seus membros como noção de ritmo, não terá condições de fazer uma mudança de pé corretamente. É incorreto e ineficiente um cavaleiro jogar, deslocar o seu corpo para um lado e para o outro, saindo da sela ou "quebrando" a cintura. Pernas soltas e sem controle não poderão ser eficientes. Alguns métodos de treino ; O cavaleiro pode iniciar a mudança de pé, quando o cavalo já domina bem o "galope reunido", com equilibrio, cadência, engajamento e atendendo bem às partidas, às transições, ao contragalope e aos altos. Com algumas exceções e com muito cuidado, a "mudança de pé" isolada pode ser feita com cavalos ainda no nível principiante, mas somente para os cavalos que tenham mais facilidade e talento para as mesmas ou quando as executam sem nenhuma resistência. É aconselhável pedir a "mudança de pé" primeiro da "direita para a esquerda". Também é lógico pedir a mudança do lado ruim para o lado melhor (se o cavalo apresentar diferenças entre os lados). Um bom método é treinar a mudança sempre no mesmo ponto do picadeiro, para que o cavalo assimile - porém se ele começa à se adiantar às ajudas, e quer mudar antes, então seria melhor variar de lugar. Não se pede muitas mudanças de uma vez para um cavalo ainda não confirmado. O ideal seria fazer esta figura de picadeiro quase no final do trabalho, quando o cavalo já está bem flexível e descontraído (mas cuidando para não pedir a mudança quando ele já está muito cansado e sem forças nas costas). Logo em seguida à mudança (mesmo que ela não tenha sido perfeitamente correta) voltar para a andadura do passo ou trote, agradando o animal, principalmente se ele for um cavalo nervoso. Ele deve aprender as mudanças de pé, sem traumas e sem o uso excessivo de esporas ou chicote. Como preparação, pode- se também fazer uma meia volta no galope justo, e retornando à parede do picadeiro pedir a "mudança de pé". Se o contragalope do cavalo for bom, muda-se do galope falso para o galope justo (sem que a garupa se desloque demais antes da mudança ). Os métodos são naturalmente variáveis, e cada cavalo reage diferentemente, por isso é importante experimentar vários exercícios, até achar qual é a melhor preparação. Cuidar para que o cavalo faça a mudança o quanto antes em "linha reta e para frente". Defeitos e correções; O erro mais comum é o cavalo atrasar o posterior interno na mudança, (um ou dois galões), ocasionado pela falta de reunião, impulsão ou fraqueza de posterior. Outros defeitos são: Perder a impulsão, galopar muito curto e tenso, manter a garupa contraída e alta, e se deslocar lateralmente. Pesar demais sobre a mão do cavaleiro (encapotar), deslocando seu equilíbrio sobre os anteriores, perdendo assim a reunião dos posteriores e a auto sustentação. As rédeas auxiliares (rédea alemã, etc.), são usadas com muito cuidado quando se pratica a mudança de pé. Somente quando o cavalo realmente não mantém o pescoço em posição correta e eleva demais a nuca é que se pode fazer uso dela, porém com muita parcimônia e leveza. A rédea alemã, por exemplo, não tem a função de fazer abaixar o pescoço e a nuca, mas somente impedir que o cavalo levante demais a cabeça à partir de um certo ponto. Se o uso da rédea for em um contato constante, o cavalo pode reagir embutindo o seu pescoço, colocando o nariz atrás da vertical, fugindo assim da mão do cavaleiro. Por isso é muito importante que o cavalo consiga fazer um "galope reunido redondo, ativo, sem tensão de dorso e garupa", pois no momento em que surgirem estas reações a mudança de pé não estará sendo feita corretamente.

A Cadeia de Reflexos da Equitação


Como acabamos de ver, o cavalo não obedece ao cavaleiro para lhe agradar. O cavaleiro, para obter uma determinada ação do cavalo, terá de acionar a sua cadeia de reflexos (mesmo que ele não saiba disso), que vem a ser uma ‘programação’ do sistema nervoso que o animal usa na sua vida natural. Isto significa que a equitação é um processo de aprendizado bilateral. O equitador aprende a reconhecer os movimentos do cavalo e a deflagrar os seus reflexos, e este aprende a reconhecer e a automatizar o código de comandos do cavaleiro. Como a cadeia de respostas condicionadas parte do sistema nervoso do cavalo, Grisone e seus violentos seguidores podem descer do seu pedestal para aprender com o cavalo o que é a boa equitação.
“A deflagração dos reflexos naturais do cavalo está ligada a dois pontos na espinha dorsal do animal chamados de dilatação cervical e dilatação lombar (veja ilustração) . A dilatação cervical comanda as ações dos membros anteriores, e a dilatação lombar a ação dos membros posteriores. Estes dois pontos são engrossamentos do sistema nervoso central, que tem início no cérebro e corre pela coluna vertebral até a garupa do cavalo e também desce para controlar as pernas. Estas duas dilatações, quando estimuladas pelos nervos sensores, deflagram os reflexos que determinam o andamento do cavalo – o passo , o trote ou a marcha , e o galope – e também as mudanças de direção, mudanças de velocidade e demais ações eqüestres” explica Dr. Rooney. O ser humano possui um sistema reflexo automatizado semelhante que permite, por exemplo, que possamos andar e conversar ao mesmo tempo, ou dirigir um automóvel e simultaneamente discutir com um amigo o desempenho do nosso time de futebol, enquanto acionamos a alavanca do câmbio com a mão direita, pisamos na embreagem com o pé esquerdo, aceleramos com o pé direto, começamos a girar o volante com a mão esquerda e conferimos, com um olhar, o espelho retrovisor — tudo ao mesmo tempo e sem nos concentrarmos diretamente no que estamos fazendo. Poderíamos chamar esta seqüência de movimentos de ‘reflexos automatizados da direção automobilística’. Vamos examinar um exemplo prático do funcionamento da cadeia de reflexos da equitação:, depois de montar pedimos, com uma pressão das pernas, a saída do cavalo para o passo. Este comando é captado pelos nervos sensores, localizados atrás do encilhadouro do cavalo, que mandam um sinal elétrico para a dilatação cervical. De lá, um estímulo nervoso corre até o músculo protator e libera uma substância química com a qual o músculo se contrai e movimenta a perna para a frente. Estes nervos, que provocam o movimento, são chamados nervos motores. Para desencadear um passo regular este processo se repete alternadamente, com o músculo retrator movimentando o membro para trás e o músculo protrator impulsionando para frente, e assim por diante. Toda esta série de reações musculares, que determinam a coordenação das passadas, são chamadas de ações reflexas. (Atenção, nem pensar em pular este trecho do livro porque esta descrição tem para a neurofisiologia da equitação a mesma importância que a Teoria da Relatividade de Einstein para as leis da física!). Então, prosseguindo: note que os nervos sensores do cavalo captam o toque das pernas do equitador, enviam a informação para a dilatação lombar, que transforma o comando do cavaleiro num gesto reflexo do animal — ou seja, o início da movimentação do passo. “Isto quer dizer” explica Dr. Rooney, “que a protração e a retração — o movimento para a frente e para trás dos membros — que realiza a ação de andar, trotar, ou marchar e galopar, pode ser regida exclusivamente pela dilatação cervical e lombar, do cavalo sem a participação direta do cérebro do animal no processo. Isto é, com a automatização dos andamentos sem a interferência do cérebro”. Mas, como se insere o cérebro na coordenação motora do cavalo? — Continua Dr. Rooney: “Numa área do cérebro, abaixo do cerebelo, existe um conjunto de centros nervosos responsáveis pela coordenação e regulagem dos movimentos do cavalo. Eles determinam o andamento (passo, trote ou marcha e galope) e determinam a seqüência em que as pernas vão se movimentar. Se um cavalo na sua vida natural estiver pastando e se, por algum motivo prático, tomar a decisão cerebral de andar, o andamento será repetido automaticamente até haver uma nova vontade de mudar de andamento ou parar” — Finaliza Dr. Rooney. Esta pesquisa, a meu ver, permite uma conclusão extraordinária. Se um cavalo estiver bem adestrado – isto é, se o conjunto estiver com os seus sistemas sensorimotores altamente afinados, e o cavaleiro executar os seus comandos com grande sutileza, o cavalo não tem como distinguir, nos centésimos de segundo em que ocorrem os toques de comunicação da cadeia de comandos da equitação, se estas ‘dicas’ estão partindo do cavaleiro ou do seu próprio sistema sensorimotor. O cavalo não só parece estar comandando a ação – o cavalo terá a sensação de estar comandando a ação. O Dr. James Rooney, que é veterinário e não equitador, fez a meu ver, uma ou outra observação que não me parece corresponder com a realidade da neurofisiologia da equitação. A interação neurofisiológica entre o cavalo e o cavaleiro nos esportes eqüestres está, provavelmente, fora da área de atuação dos médicos veterinários e ainda não ingressou no currículo dos especialistas em fisiologia do exercício humano. Resta, portanto, a nós equitadores fazermos as primeiras observações acerca do fenômeno fisiológico da equitação que, mais do que qualquer outro, é o principal responsável pela trajetória histórica da humanidade. Dr. Rooney não tratou, por exemplo, do fato do cavaleiro também ter de organizar os seus próprios reflexos para a equitação em ações automatizadas, que se coordenarão com as do seu cavalo – o que estou chamando, aqui, de fusão neurofisiológica homem-cavalo. Transcrevi, para este livro, as observações que me pareceram as mais importantes na ótica da prática interativa da equitação, que chamaremos de neurofisiologia da equitação, um termo que me parece faltar até hoje no vernáculo da equitação.
A compreensão da fisiologia da equitação — que engloba a interação da psicologia e da neurofisiologia do Homem e do Cavalo — vai modificar radicalmente os antigos métodos de ensino da equitação sistematizados a partir da renascença italiana. A revolução na percepção do cavalo e da equitação, que está começando a ocorrer no mundo, será tão abrangente como as transformações da economia global decorrentes da introdução da informática. Para a equitação, o século 21 vai ser muito diferente daquele que passou. (Com a participação involuntária de Dr. James Rooney)

A Neurociência Revela os Princípios da Equitação

A equitação pode, e deve, se beneficiar com as novas informações científicas que não param de enriquecer o conhecimento humano. Na busca por técnicas mais eficientes para se montar a cavalo convém, além de rever os velhos manuais de equitação, procurar novas fontes e fatos nas ciências contemporâneas que possam nos ajudar a ampliar os limites da nossa percepção do cavalo e da fisiologia da equitação. Acredito que, para se contribuir com o que já é sabido, não basta traduzir, transcrever e concordar com a bibliografia existente. Hoje, mais do que nunca, é preciso equitar, avaliar, duvidar e pesquisar para, então, ajudar a reconceituar as teorias existentes à luz da ciência. “Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende” escreveu, com grande sabedoria, Guimarães Rosa.
Antes de nos aprofundarmos numa filosofia avançada da equitação, vamos analisar a neurologia do cavalo que permite a equitação em si, segundo uma pesquisa realizada por Dr. James Rooney, professor de Patologia Veterinária da Universidade da Pensilvania. O estudo, intitulado The Chain of Riding Reflexes -- A cadeia de reflexos da equitação --realizado nos anos 70, revela que o cavalo reage aos comandos do cavaleiro através de reflexos condicionados organizados durante o processo de treinamento do animal. Esta extraordinária informação pode estabelecer bases sólidas para se realizar uma fusão mais completa do sistema neurofisiológico do cavalo e do cavaleiro. As técnicas para esta fusão foram desenvolvidas instintivamente pelos inventores da equitação, os nômades da Ásia Central, e por alguns grandes cavaleiros. Um deles foi Caprilli, que acabou sendo conhecido apenas como o criador do ‘assento adiantado’ usado atualmente por todos os cavaleiros nos saltos de obstáculos. Esta fusão pode ser descrita assim: o cavalo e o cavaleiro evoluem na ação eqüestre como um único ser. O cavaleiro em perfeita sintonia com o ritmo e os movimentos do cavalo, os dois unidos por uma ação de gestos, sentidos e objetivos casados. O cavalo é a extensão do cavaleiro e este, o prolongamento do cavalo. Entre os dois seres neurofisiologicamente conectados, um fluxo de informações retroalimenta continuamente a ação do conjunto. Visualmente tem-se a impressão de que o cavalo comanda a ação, tal a sutileza dos comandos do cavaleiro e a harmonia de performance do conjunto. A partir desta imagem, fica claro que existe muito mais por trás de uma equitação de alta performance, do que o uso de mãos, pernas, esporas e chicotes - as tradicionais ‘ajudas’ que, usadas indiscriminadamente, atrapalham mais do que ajudam, provocando uma ação eqüestre feia e de pouco rendimento esportivo. “Para se obter um alto nível de desempenho esportivo”, diz Dr. James Rooney, “é importante se conhecer o funcionamento da coordenação motora do cavalo, para dela tirar melhor proveito”. E, a partir daí, aprender a desencadear uma seqüência de comandos que, por sua vez, vai catalisar no cavalo a cadeia de respostas condicionados da equitação , um processo neurofisiológico muito mais próximo da cibernética do que das leis da mecânica convencional. Acredito que o estudo da cadeia de reflexos da equitação do Dr. James Rooney está para a equitação, assim como o heliocentrismo de Copérnico está para a astronomia. Como um Copérnico moderno, Dr. James Rooney nos possibilitou uma visão científica de um mundo até então desconhecido - o do desempenho eqüestre - um universo tradicionalmente povoado por mitos, equívocos, conclusões conflitantes, burrice e até charlatanismo.
http://www.desempenho.esp.br/livro/get_capitulo.cfm?id=87