19 de novembro de 2009

Contribuições da Equoterapia na atuação Psicopedagógica

Introdução : A importância histórica do cavalo no processo da evolução humana é inegável. Ao longo dos tempos ele foi utilizado como meio de trabalho, lazer, esporte e tantos outros. Atualmente, este animal, com tantas virtudes e qualidades, vem se destacando como agente de reabilitação e educação no tratamento de pessoas com necessidades educativas especiais, dando origem à equoterapia. Cirillo (apud FREIRE, 1999) define a equoterapia como um método de reeducação e reabilitação motora e mental, através da prática de atividades eqüestres e técnicas de equitação. O autor entende que o tratamento ocorre tanto no plano educativo pedagógico, reeducando, quanto no plano físico e psíquico, de terapia propriamente dita. Na relação com o cavalo, além do favorecimento de uma interação afetiva, o praticante encontra subsídios para sua reeducação, reabilitação e finalmente um novo tipo de educação. Para Lallery (1988) a equitação terapêutica consiste numa terapia psico-corporal do indivíduo em todo o seu SER, tendo como objetivo levá-lo a uma autonomia motora e psicológica, a uma adaptação com independência e a descobrir que o viver pode se realizar com prazer e não somente com repressão e sofrimento. A inteligência, segundo Bossa e Oliveira (1997), constrói-se através da organização do vivido, num contínuo vaivém, num recomeçar incessante. Para Rocha (1999), o desenvolvimento intelectual é o processo pelo qual as estruturas da inteligência se constróem progressivamente, por meio de uma contínua interação entre o sujeito e o meio externo. Durante esta interação, cada vez que a estrutura apresenta-se insuficiente para resolver um dado problema, o indivíduo tem que ampliá-la e torná-la mais evoluída para restabelecer o equilíbrio. A aprendizagem inicia-se com a vida e com ela se desenvolve. A passagem da ação à representação dá-se através de um fazer prático e interessante que, pouco a pouco, ao ir organizando o contexto vivido, vai internalizando a ação. É, portanto, uma atividade criativa por natureza, de descoberta e de invenção de novos meios para reorganizar a realidade por meio da qual o indivíduo se conduz ao conhecimento. Todo ser humano possui talentos que podem ser explorados e que funcionam como estímulos para vencer suas próprias limitações. Para tanto, é necessário um ambiente altamente estimulante, reforçador, prazeroso e exigente para que passo a passo este processo se efetive, em particular no caso de crianças com disfunções do desenvolvimento neurológico, cuja capacidade para entender os conceitos básicos das habilidades cognitivas varia consideravelmente. A equoterapia apresenta-se, assim, como a possibilidade de um trabalho compromissado, de fortalecimento da auto-estima, que leva a pessoa a se motivar e a participar mais efetivamente do processo terapêutico. Conviver com o cavalo ensina a criança a tornar-se mais atenta e a praticar a auto-análise para enfrentar suas dificuldades. Partindo do princípio de que toda criança possui potencial para o aprendizado, foi desenvolvido um programa de trabalho individual e em grupo de acordo com as necessidades específicas de cada praticante. O objetivo da equoterapia é proporcionar ao praticante um desenvolvimento global de seu ser, bem como sua integração na sociedade, respeitando suas limitações e observando seu potencial de desenvolvimento – objetivo comum ao da Associação Nacional de Equoterapia: “aprender a aprender”.A Equoterapia na Ação Pedagógica : De acordo com Severo (1999) para se entender os benefícios da equoterapia no ser humano e, principalmente, na criança, há necessidade de se estabelecer, a princípio que o ser humano é um produto filogenético, ontogenético e cultural, sendo o sistema nervoso, os estados psicológicos e as situações sociais os grandes responsáveis pela aprendizagem e pelos desempenhos comportamentais. Medeiros e Dias (2002) entendem que o sistema nervoso central é um órgão de reação ao invés de ação; reage aos estímulos que para ele convergem a partir de fora e de dentro do corpo. A função mais importante do sistema nervoso central é sua capacidade de inibir a atividade “incoordenada” ou indesejada e facilitar as funções utilitárias simultaneamente, para assim tornar possível o armazenamento de informações, ou seja, a capacidade de aprender. Os fatores psicomotores distribuídos pelas unidades funcionais, de acordo com Luria (1961), são apresentados como circuitos dinâmicos autoregulados, construídos segundo o princípio da organização vertical de estruturas do cérebro e dependentes de uma hierarquização funcional e afetiva, que ocorre em todo o desenvolvimento da criança. Segundo Severo (1999), que aborda em seus estudos as unidades funcionais descritas por Luria (1961), a primeira unidade funcional do encéfalo compreende, entre outras funções, a tonicidade, o equilíbrio e a coordenação (tronco cerebral e cerebelo). A atenção é importante coadjuvante de todas as aprendizagens, junto às necessidades e aos interesses. A segunda unidade funcional estabelecida por Luria (1961) compreende, entre outros, os seguintes fatores psicomotores (estados sensitivos): lateralização, esquema corporal e estruturação espaçotemporal. A outra unidade funcional (a terceira estabelecida por Luria) integra os outros fatores psicomotores: praxia global e praxia fina (o saber fazer). Severo (1999) enfatiza que, nas duas primeiras unidades funcionais, as crianças não apresentam dificuldades de aprendizagem, embora, na segunda, elas possam apresentar discretas dificuldades psicomotoras em algumas realizações. No terceiro perfil, estarão as crianças com dificuldades de aprendizagem leves, traduzindo já a presença de um ou mais sinais de atraso no desenvolvimento neuro-evolutivo. Elas realizam tarefas com dificuldades, mas não podem ser rotuladas como deficientes. Necessitam, apenas, de atendimento especializado na área da psicopedagogia. O autor diz ainda que há pelo menos três conceitos envolvidos no desenvolvimento humano: a psicomotricidade, as relações cérebrolinguagem e as relações cérebro-comportamento. Por isso é essencial que, antes da aplicação de qualquer terapia, haja um grupo de pessoas especializadas nos diversos componentes neuropsicológicos e psicopedagógicos para avaliar uma criança com dificuldades de aprendizagem e indicar a terapia mais coerente para cada uma. Nessas avaliações psicopedagógicas, a relação de fatores que influenciam o aprendizado pode ser muito eficaz na observação de problemas: de atenção, de motivação, de necessidade, de percepção, de memória, de ordem psicológica (afetivo-emocional), de cognição, de psicolinguagem, de psicomotricidade e de motricidade. Shkedi (1997) afirma que as habilidades escolares básicas referemse à linguagem e ao pensamento. Montar a cavalo auxilia na aquisição dessas habilidades e na elaboração de pensamento coerente, as quais requerem o uso de ambos os hemisférios cerebrais. Segundo a autora, é a motivação para cavalgar que estimula a criança a progredir com ordens e seqüências espaciais e temporais. Ou seja, montar ajuda a criança que apresenta dificuldades de aprendizagem. Educar é ajudar o ser humano, com os princípios e os fundamentos do ensino e da aprendizagem, informal e formal, na família e na sociedade, a transformar-se pelo crescimento e pelo desenvolvimento biopsicossocial em um cidadão com liberdade, felicidade e paz (HORNE, 1996). A equoterapia pode apoiar a educação de crianças com dificuldades de aprendizagem, deficiências físicas e/ou mentais, com condutas sociais atípicas e com altas habilidades. A professora Tereza Isoni (1996) afirma que a equoterapia facilita a organização do esquema corporal; facilita a aquisição do esquema espacial; desenvolve a estrutura temporal; aguça o raciocínio e o sentido de realidade; desperta uma profunda comunhão criança-realidade; proporciona e facilita a aprendizagem da leitura, da escrita e do raciocínio matemático; aumenta a cooperação e a solidariedade; minimiza os distúrbios comportamentais; promove a auto-estima, a auto imagem e a segurança; facilita e acelera os processos de aprendizagem. Conforme Shkedi (1997), os terapeutas podem promover excelentes oportunidades, durante as sessões de equoterapia, para que crianças com deficiência de atenção ou distraídas focalizem, concentrem-se, aumentem a motivação e alcancem um nível no qual o progresso de aprendizagem seja notável em todas as áreas das funções psiconeurológicas. Enfatiza a autora que cavalgar auxilia as crianças com disfunções da memória, porque exige planejar e criar estratégias, que são progressivamente memorizadas. Isto não é fácil de ser executado e é necessário prender pela repetição, memorizar e, pela cuidadosa explanação, completar tarefas cotidianas. Desenvolvimento e Resultados da Experiência com Equoterapia :A equoterapia é um método terapêutico que utiliza o cavalo comoinstrumento. O atendimento de equoterapia é realizado no Centro de Equoterapia Marisa Tupan – EQUUS, em Maringá-PR com atendimento a crianças, adolescentes e adultos, desde 1996. As pessoas que são encaminhadas ao atendimento de equoterapia, num primeiro momento são submetidas a uma avaliação com uma equipe interdisciplinar: neurologista, psicólogo, psicopedagogo, fisioterapeuta e fonoaudiólogo. Em seguida faz-se estudo do caso e, se indicado o atendimento, o profissional elabora um programa de atuação terapêutica a ser realizado. O atendimento ocorre uma vez por semana com duração de 50 minutos, com sessões individuais ou em grupos. Existe um espaço coberto e um aberto para diversificar o atendimento e fazer com que o praticante receba luz solar e tenha contato direto com a natureza. No início do atendimento o praticante é estimulado a manter contato com o animal, escovando-o, dando banho, alimentando-o, solicitando-se também a execução de atividades que envolvam o manuseio de materiais didáticos diversificados, como brinquedos, letras do alfabeto, formas geométricas, numerais e outros. Os materiais são de plástico e emborrachados imantados para que possam aderir aos painéis de chapas galvanizadas. Pode-se afirmar que os resultados do trabalho com o cavalo vão além do movimento tridimensional, repercutindo também no desenvolvimento das funções psicológicas e cognitivas. Durante todo o período de existência do Centro de Equoterapia Marisa Tupan (EQUUS), constatou-se que todos os praticantes apresentaram significativa evolução, tanto no contexto escolar e social quanto no domiciliar. O cavalo pode ser um ativador da atenção, intenção e iniciativa, tanto da criança como dos terapeutas. A equoterapia pode desenvolver a responsabilidade de forma equilibrada, melhorando a auto estima e a independência por meio de orientações recebidas em cima do animal, no momento da própria terapia, induzindo a uma aprendizagem significativa e prazerosa. Conclusão : O trabalho de equoterapia que vem sendo desenvolvido pode atingir pessoas com vários tipos de distúrbios e ou deficiências. Constata-se que o praticante melhora consideravelmente suas habilidades de orientação espacial, equilíbrio, lateralidade, comunicação, compreensão de leitura, escrita, raciocínio lógico, memória, tem ganhos físicos que favorecem a sensibilidade, a percepção do esquema natural, entre outros. Destaca-se também o aumento da atenção e de motivação diante das dificuldades de aprendizagem e o aumento da auto estima, proporcionando um sentimento de pertencer a um meio escolar acolhedor e importante para o indivíduo. “Onde não existir afeto de fato não há relação humana possível” (RISKALLA, 2002).

Marcia Regina de Sousa Storer - Mestranda em Distúrbios do Desenvolvimento – Psicopedagoga e Terapeuta do Centro Integrado São Leopoldo , Marcia Regina Volpato de Oliveira - Psicopedagoga e Terapeuta doCentro Integrado São Leopoldo , Marisa Cordeiro Tupan - Fisioterapeuta – Coordenadora do Centro de Equoterapia Marisa Tupan – Terapeuta da Clínica de Fisioterapia Especializada Pró-Fisio Maringá-PR